Um dos debates persistentes no tratamento do câncer de mama em estágio inicial diz respeito ao papel da radioterapia da parede torácica após a mastectomia em pacientes com risco intermediário. Agora, resultados de 10 anos de seguimento do estudo internacional de fase 3 SUPREMO trazem evidências robustas de que a omissão da irradiação não impacta negativamente a sobrevida global dessas pacientes. O estudo foi publicado na New England Journal of Medicine (NEJM).
“O papel da irradiação da parede torácica pós-mastectomia em pacientes com câncer de mama classificado como pN1 (com comprometimento de um a três linfonodos axilares) ou pN0 (patologicamente negativo para linfonodos) com fatores de risco adicionais é incerto”, contextualizam os pesquisadores.
No estudo randomizado SUPREMO, os pesquisadores avaliam a omissão da irradiação da parede torácica em mulheres com câncer de mama de “risco intermediário” — definido como câncer em estágio pT1N1, pT2N1 ou pT3N0 ou em estágio pT2N0 com grau histológico 3, invasão linfovascular ou ambos (tamanho do tumor: T1, ≤2 cm; T2, >2 cm a 5 cm; ou T3, >5 cm) — que foram tratadas com mastectomia, procedimento axilar e terapia sistêmica.
As pacientes foram randomizadas para receber irradiação da parede torácica (40 a 50 Gy; grupo de irradiação) ou não receber irradiação da parede torácica (grupo sem irradiação). O desfecho primário foi a sobrevida global, com 10 anos de acompanhamento. Também foram avaliados a recorrência na parede torácica, recorrência regional, sobrevida livre de doença, sobrevida livre de metástases à distância, causas de óbito e eventos adversos relacionados à radiação.
A população por intenção de tratar incluiu 808 pacientes no grupo de irradiação e 799 no grupo sem irradiação. A mediana de acompanhamento foi de 9,6 anos. A sobrevida global foi de 81,4% com irradiação da parede torácica e 81,9% sem irradiação da parede torácica, de acordo com as estimativas de Kaplan-Meier em 10 anos (razão de risco para óbito, 1,04; intervalo de confiança [IC] de 95%, 0,82 a 1,30; P=0,80).
Um total de 29 pacientes apresentaram recidiva na parede torácica — 9 (1,1%) no grupo de irradiação e 20 (2,5%) no grupo sem irradiação (diferença entre os grupos <2 pontos percentuais; razão de risco, 0,45; IC 95%, 0,20 a 0,99). A sobrevida livre de doença foi de 76,2% no grupo de irradiação e 75,5% no grupo sem irradiação (razão de risco para recidiva ou óbito, 0,97; IC 95%, 0,79 a 1,18), e a sobrevida livre de metástase à distância foi de 78,2% e 79,2%, respectivamente (razão de risco para metástase à distância ou óbito, 1,06; IC 95%, 0,86 a 1,31).
Embora a radioterapia tenha reduzido discretamente as recidivas locais, o benefício absoluto foi pequeno — menos de 2 pontos percentuais — e não se traduziu em melhora na sobrevida global ou livre de doença.
“Em tempos de tratamentos sistêmicos modernos, o impacto da radioterapia adjuvante em tumores de risco intermediário parece mais limitado. Esses resultados reforçam a possibilidade de individualizar a indicação de radioterapia, evitando potenciais toxicidades em pacientes com baixo benefício esperado”, afirmam os pesquisadores.
Em síntese, o estudo SUPREMO traz evidência de que a omissão da irradiação da parede torácica é segura em mulheres com câncer de mama precoce de risco intermediário tratadas com mastectomia e terapia sistêmica contemporânea.
“Os dados oferecem suporte para estratégias de desintensificação do tratamento, preservando a eficácia oncológica e reduzindo a exposição desnecessária à radioterapia”, concluem os autores.
O estudo foi financiado pelo Medical Research Council, entre outros; número de registro do estudo clínico SUPREMO ISRCTN: 61145589.
Referência:
Ten-Year Survival after Postmastectomy Chest-Wall Irradiation in Breast Cancer - Ian H. Kunkler, F.R.C.R., Nicola S. Russell, M.D., Ph.D., Niall Anderson, Ph.D., Richard Sainsbury, M.D., J. Michael Dixon, M.D., David Cameron, M.D., Juliette Loncaster, F.R.C.R., +37, for the SUPREMO Trial Investigators - Published November 5, 2025. N Engl J Med 2025;393:1771-1783. DOI: 10.1056/NEJMoa2412225. VOL. 393 NO. 18