Onconews - Estudo mostra impacto econômico e assistencial da ausência de cuidados paliativos em pacientes com câncer de cabeça e pescoço

Estudo de coorte avaliou o impacto da utilização de traqueostomia ou sonda enteral (gastrostomia – g-tube) na qualidade de vida e nos custos do final de vida de pacientes com câncer de cabeça e pescoço. Os resultados revelam que a ausência de cuidados paliativos nesses pacientes pode triplicar os custos mensais nos últimos seis meses de vida, com implicações importantes para os sistemas de saúde. O trabalho foi publicado no JAMA Otolaryngology - Head Neck Surgery.

“Pacientes com câncer de cabeça e pescoço (CCP) apresentam altas taxas de utilização de traqueostomia ou gastrostomia (tubos g) no final da vida, com altos custos associados. Não se sabe se o momento do início dos cuidados paliativos (CP) pode atenuar o custo ou estar associado a uma melhor qualidade de vida no último ano e a um maior número de mortes em domicílio”, afirmam os autores.

Nesse estudo, o objetivo foi avaliar a associação entre cuidados paliativos (primeira exposição) e utilização de traqueostomia ou tubo g com os custos no final da vida entre pacientes com câncer de cabeça e pescoço durante o último ano de vida.

Este estudo de coorte de base populacional incluiu adultos diagnosticados com câncer de cabeça e pescoço entre 1º de janeiro de 2007 e 31 de dezembro de 2022, que faleceram antes de 1º de outubro de 2023, em Ontário, Canadá. A análise dos dados populacionais vinculados ao ICES (Institute for Clinical Evaluative Sciences) foi realizada entre janeiro de 2024 e junho de 2025.

O momento do cuidado paliativo, categorizado como precoce (12 a 6 meses antes do óbito), tardio (<6 meses antes do óbito) e nenhum (nenhum cuidado paliativo durante o último ano de vida), foi combinado com o uso de tubo de traqueostomia (binário) para formar uma variável categórica de 6 níveis. Este procedimento foi repetido para o tubo g.

Foram estimados os custos médios mensais com assistência médica nos últimos 6 meses de vida usando um algoritmo de custeio de caso em nível de paciente, utilizando CAD$ 2023 (CAD$ 1,00 = US$ 0,74) e avaliados por regressão binomial negativa.

A análise incluiu 11.135 adultos que receberam o diagnóstico de câncer de cabeça e pescoço entre 2007 e 2022 e faleceram antes de 1º de outubro de 2023. Eles tinham uma mediana de 68,4 (12,1) anos de idade no momento do diagnóstico e 8.245 eram do sexo masculino (74,0%). Quase 90% receberam cuidados paliativos: 5.866 (52,6%), cuidados paliativos tardios; 4.093 (36,8%), cuidados paliativos precoces; e 1.176 (10,6%) não receberam cuidados paliativos.

Em relação ao uso de traqueostomia/sonda gástrica no último ano de vida, 1.293 (11,6%) usaram traqueostomia e 1.235 (11,1%), sonda gástrica. Em comparação com aqueles que não receberam cuidados paliativos nem usaram tubo de traqueostomia, o aumento de custo com o uso de tubo de traqueostomia ([RR] 2,93; IC 95%, 2,32-3,71) foi maior do que com o uso com cuidados paliativos precoces (RR, 2,88; IC 95%, 2,63-3,15), mas menor do que com o uso com os cuidados paliativos tardios (RR 4,37; IC 95%, 4,00-4,77); os resultados foram semelhantes para o uso do tubo g.

Uma grande proporção da coorte teve uma visita ao pronto-socorro (9.109 [81%]) ou uma internação hospitalar sem cuidados paliativos (5.419 [48,7%]) nos últimos 6 meses de vida. Os cuidados paliativos precoces foram associados a uma probabilidade 46,8% menor (RR, 0,53; IC 95%, 0,45-0,63) de morte em casa do que a ausência de cuidados paliativos.

Apesar da alta adesão aos cuidados paliativos, o estudo identificou uma prevalência significativa de hospitalizações não paliativas (48,7%) e visitas a serviços de emergência (81%) nos últimos seis meses de vida, refletindo a persistência de um modelo de cuidado centrado em intervenções hospitalares intensivas. Além disso, a chance de morrer em casa — muitas vezes considerada uma métrica de qualidade nos cuidados de fim de vida — foi menor entre aqueles que receberam cuidados paliativos precoces (OR: 0,53; IC 95%, 0,45-0,63) em comparação aos que não receberam cuidados paliativos. Esse dado sugere que apenas a introdução dos cuidados paliativos, sem uma abordagem coordenada e multidisciplinar, pode não ser suficiente para promover desospitalização no fim da vida.

Os autores concluem que a introdução precoce e planejada de cuidados paliativos em pacientes com CCP que necessitam de intervenções como traqueostomia ou g-tube pode reduzir substancialmente os custos no final da vida, ainda que não garanta, por si só, a redução da assistência hospitalar intensiva ou a morte em domicílio.

“Os dados evidenciam a necessidade de abordagens integradas, com equipes multidisciplinares atuando precocemente, especialmente em pacientes com doenças avançadas e complexas como o câncer de cabeça e pescoço, e reforçam que os cuidados paliativos não são apenas uma questão de qualidade assistencial, mas também de sustentabilidade dos sistemas de saúde”, concluem os pesquisadores.

Referência:

Fu R, Sutradhar R, Li Q, et al. Palliative Care With Tracheostomy or Gastrostomy Tube Use and End-of-Life Quality and Costs Among Patients With Head and Neck Cancer. JAMA Otolaryngol Head Neck Surg. Published online September 25, 2025. doi:10.1001/jamaoto.2025.2687