Resultados de estudo sueco reforçam que a estratégia watchful waiting é apropriada para minimizar consequências adversas do câncer de próstata em homens com expectativa de vida no diagnóstico inferior a 10 anos. O trabalho foi publicado no JAMA Network Open. O oncologista Eduardo Zucca (foto), diretor de ensino e pesquisa do Instituto do Câncer Brasil, analisa os resultados.

Diferentemente da vigilância ativa (active surveillance), a estratégia watchful waiting (espera vigilante, em tradução livre) não envolve exames de rotina para monitorar a evolução da doença, se concentrando estritamente nos sintomas do paciente. A estratégia é geralmente oferecida a pacientes muito idosos ou com outras comorbidades importantes que possam comprometer o benefício do tratamento localizado. No entanto, não se sabe até que ponto essa estratégia está associada a resultados adversos.

Este estudo de coorte de base populacional, de âmbito nacional, incluiu homens com câncer de próstata não metastático diagnosticado desde 2007 e registrados no Registro Nacional de Câncer de Próstata da Suécia com watchful waiting como estratégia de tratamento primária e com expectativa de vida inferior a 10 anos. A expectativa de vida foi calculada com base na idade, no Índice de Comorbidade de Charlson (ICC) e no índice de comorbidade medicamentosa. Os modelos de transição de estado observados complementaram os dados observados para estender o acompanhamento para mais de 20 anos. As análises foram realizadas entre 2022 e 2023.

Os pesquisadores buscaram relatar transições para terapia de privação androgênica (ADT), câncer de próstata resistente à castração (CRPC), morte por câncer de próstata ou morte por outras causas em homens com watchful waiting.

Resultados

A amostra incluiu 5.234 homens com mediana de 81 anos no momento do diagnóstico (79-84 anos). Após 5 anos, 954 homens com câncer de próstata de baixo risco (66,2%) e 740 com câncer de próstata de alto risco (36,1%) ainda estavam vivos e não recebiam ADT. Aos 10 anos, as proporções correspondentes foram de 25,5% (n = 367) e 10,4% (n = 213), respectivamente. Após 10 anos, 59 homens com câncer de próstata de baixo risco (4,1%) e 221 com doença de alto risco (10,8%) fizeram a transição para câncer de próstata resistente à castração. Dez anos após o diagnóstico, aconteceram 1.330 mortes no grupo de baixo risco (92,3%) e 1.724 no grupo de alto risco (84,1%) por outras causas além do câncer de próstata.

Em síntese, neste estudo de coorte com 5.234 homens diagnosticados com câncer de próstata não metastático e com expectativa de vida inferior a 10 anos no momento do diagnóstico, a estratégia watchful waiting foi associada a um baixo risco de progressão e mortalidade por câncer.

Zucca observa que alguns guidelines, entre eles as diretrizes do National Comprehensive Cancer Network, recomendam o screening de câncer de próstata até os 75 anos de idade, e acima dessa idade apenas para indivíduos muito saudáveis, às vezes com uma expectativa de vida maior do que 10 anos. “Nesse estudo a média de idade dos pacientes é de 81 anos, e foram excluídos pacientes metastáticos. Talvez essa seja a primeira crítica, porque esses pacientes foram de 81 anos foram diagnosticados com câncer de próstata”, diz.

“Uma grade quantidade de pacientes morrem por outras causas, mas nós temos alguns pacientes que morrem por câncer de próstata, o que é ruim quando você individualiza o paciente que fez um diagnóstico de câncer de próstata, a equipe médica optou por não fazer o tratamento curativo inicial e ele faleceu por câncer de próstata”, afirma Zucca, acrescentando que apesar de ser uma quantidade muito pequena é importante ressaltar esses resultados porque a individualização do tratamento, mesmo no watchful waiting, se faz extremamente relevante. “É preciso encontrar o melhor perfil de paciente para fazer um watchful waiting mais cuidadoso, com visitas mais frequentes à clínica ou hospital e não simplesmente quando apresentar sintomas”, afirma.

O oncologista avalia que o estudo é relevante para a prática clínica pois traz segurança para indicar a estratégia de watchful waiting para esses pacientes com aproximadamente 80 anos que recebem o diagnóstico de câncer de próstata localizado, garantindo uma qualidade de vida sem a deprivação hormonal. “A hormonioterapia não é uma terapia inócua, ela pode levar a muitas comorbidades, como por exemplo impotência sexual, perda de massa óssea, aumento de eventos cardiovasculares, principalmente naqueles pacientes que já tiveram algum evento cardiovascular prévio e muitas vezes até diminuição e alteração de memória. Por isso, poupar os pacientes do tratamento, quando for possível, é sempre uma estratégia a ser considerada”, conclui.

Referência:

Ventimiglia E, Gedeborg R, Styrke J, Robinson D, Stattin P, Garmo H. Natural History of Nonmetastatic Prostate Cancer Managed With Watchful Waiting. JAMA Netw Open. 2024;7(6):e2414599. doi:10.1001/jamanetworkopen.2024.14599