Lições do plano de expansão da radioterapia brasileira

SAMIR HANNA NET OKSamir Abdallah Hanna (foto), médico especialista em radioterapia do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, é primeiro autor de estudo que buscou analisar a execução e implantação das instalações propostas pelo Plano de Expansão da Radioterapia para o Sistema Único de Saúde do Brasil (PER-SUS) e sua capacidade de enfrentamento dos problemas de acesso à radioterapia no Brasil. Os resultados publicados no periódico Lancet Regional Health – Americas demonstram que após dez anos, o projeto entregou cerca de 50% da implantação planejada de equipamentos de radioterapia. “Houve um crescimento de 17% no número nacional de aceleradores lineares (LINACS) com PER-SUS, contra um aumento de 32% na incidência de câncer no Brasil no mesmo período”, afirmam os autores.

O Sistema Único de Saúde (SUS) vem proporcionando acesso universal à saúde para pacientes com câncer sob vários desafios, incluindo o aumento da incidência de câncer ao longo do tempo, desvantagens geográficas e socioeconômicas e heterogeneidade de acesso à saúde de acordo com a região. Além disso, a disponibilidade de equipamentos de radioterapia está abaixo do necessário para atender as demandas atuais e futuras. Na tentativa de melhorar o acesso à saúde e aos tratamentos oncológicos, especificamente a radioterapia, algumas iniciativas governamentais têm sido colocadas em prática, como o PER-SUS (Plano de Expansão da Radioterapia no Sistema Único de Saúde, ou Plano de Expansão da Radioterapia para o SUS). Esse programa foi lançado em 2012, e há poucas informações disponíveis sobre o real impacto da superação dos problemas mencionados.

Nesse estudo, os pesquisadores analisaram retrospectivamente todos os relatórios mensais de andamento do PER-SUS desde a primeira divulgação (fevereiro de 2015) até outubro de 2021. Foram coletados as instituições beneficiárias, localização do projeto, status do projeto, tipo de projeto, datas de andamento das etapas e motivos de cancelamento ou possíveis justificativas para alteração do status. Dados geográficos brasileiros, demandas de saúde e incidência de câncer foram correlacionados. Os autores utilizaram o diagrama de Ishikawa e a metodologia 5W3H para compreender melhor os achados e apresentar possíveis formas de melhorar o acesso à radioterapia.

Resultados

Após dez anos, o projeto PER-SUS entregou cerca de 50% da implantação planejada de equipamentos de radioterapia. Houve um crescimento de 17% no número nacional de aceleradores lineares (LINACS) com PER-SUS, contra um aumento de 32% na incidência de câncer no Brasil no mesmo período.

A partir dos resultados do estudo, os autores identificaram os seguintes pontos críticos: alto índice de exclusão das instituições, o que reflete a seleção inadequada das instituições ou planejamento inadequado para o projeto; atraso na execução estava relacionado a entraves burocráticos, bem como a subestimação dos requisitos de planejamento (logística/pessoas); o dimensionamento audacioso do PER-SUS não pareceu superar a questão da assistência oncológica; o investimento tecnológico não cobre todas as necessidades; a saída do investimento em ensino/pesquisa não foi evidenciada (sem dados apresentados), principalmente devido ao fechamento antecipado da fábrica da empresa vencedora da licitação para fornecer os equipamentos PER-SUS e capacitação profissional; além disso, o fechamento da fábrica de equipamentos também foi consequência de planejamento inadequado e falta de priorização do projeto por parte do governo.

“A dimensão da necessidade de atendimento radioterápico no Brasil é maior do que o considerado, podendo não ser atendido integralmente pelo PER-SUS. Variáveis ​​geográficas, epidemiológicas, logísticas e econômicas poderiam ser reavaliadas para permitir um melhor planejamento estratégico e propostas de melhoria. O PER-SUS poderia ser otimizado para a próxima década, envolvendo a participação, alinhamento e engajamento de todos os stakeholders”, avaliam os autores. “No futuro, os estados e regiões com maior escassez de LINACs devem ser priorizados para melhorar o acesso à radioterapia em todo o país. Considerando os dados e o prazo inicial do projeto, o PER-SUS não atingiu as metas pré-estabelecidas especificadas pelo governo brasileiro”, concluem.

O trabalho é fruto do trabalho de conclusão do MBA (FGV-EAESP) do radio-oncologista Samir Hanna, e não recebeu nenhuma bolsa específica de agências de financiamento nos setores público, privado ou sem fins lucrativos.

Referência: Lessons from the Brazilian radiotherapy expansion plan: A project database study - Samir Abdallah Hanna; Andre Guimaraes Gouveia; Fabio Ynoe Moraes; Arthur Accioly Rosa; Gustavo Arruda Viani; Adriano Massuda - Open Access Published: July 19, 2022 - DOI:https://doi.org/10.1016/j.lana.2022.100333