PRODIGE: desintensificação terapêutica no câncer de pâncreas metastático

rui fernando weschenfelder 21 bxDepois de demonstrar benefício de sobrevida global com a quimioterapia de 6 meses com fluorouracil, leucovorina, irinotecano e oxaliplatina (FOLFIRINOX) sobre a gencitabina no câncer de pâncreas metastático, pesquisadores franceses reportam novos dados da série PRODIGE, agora com resultados da neurotoxicidade relacionada à oxaliplatina avaliada em um regime intermitente (stop and go) e em uma estratégia sequencial. Os resultados apoiam a desintensificação da quimioterapia nessa população de pacientes. "A mensagem principal é que a gente não precisa manter tratamento pleno nos pacientes para garantir benefício a longo prazo, pode introduzir a oxaliplatina se possível no futuro", analisa Rui Weschenfelder (foto), coordenador do Centro de Oncologia Gastrointestinal do Hospital Moinhos de Vento de Porto Alegre e vice-presidente do Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais (GTG).

Neste estudo de fase II (PANOPTIMOX-PRODIGE 35), os pacientes foram randomizados para receber 6 meses de FOLFIRINOX (braço A), 4 meses de FOLFIRINOX seguido por leucovorina mais tratamento de manutenção com fluorouracil para pacientes com controle de doença (braço B), ou um tratamento sequencial alternando gencitabina e fluorouracil, leucovorina e irinotecano a cada 2 meses (braço C). O endpoint primário foi a sobrevida livre de progressão em 6 meses.

Resultados

Entre janeiro de 2015 e novembro de 2016, foram inscritos 276 pacientes (idade média: 63 anos; intervalo: 40-76 anos) randomizados nos três braços de análise (A: 91, B: 92 e C: 90). Os autores descrevem que a neurotoxicidade de grau 3 ou 4 ocorreu em 10,2% dos pacientes no braço A e em 19,8% no braço B.

A proporção de pacientes que alcançou o equilíbrio entre a dose recebida / dose-alvo de oxaliplatina foi de 83% no braço A e de 92% no braço B. A sobrevida livre de progressão em 6 meses foi de 47,1% no braço A, 42,9% no braço B e de 34,1% no C. A sobrevida global mediana foi de 10,1 meses no braço A, 11,2 no braço B e de 7,3 no braço C.

Quando considerada a sobrevida sem deterioração na qualidade de vida, os escores foram maiores no braço de manutenção (11,4 meses) do que nos braços A e C (7,2 e 7,5 meses, respectivamente).

A conclusão dos autores sugere que a manutenção com leucovorina mais fluorouracil parece ser viável e eficaz em pacientes com câncer pancreático metastático com doença controlada após 4 meses de quimioterapia de indução com FOLFIRINOX. A neurotoxicidade grave foi maior no braço de manutenção, "provavelmente devido à maior dose cumulativa de oxaliplatina”, conclui a análise.

Para os autores, este estudo apoia a incorporação de uma estratégia de desintensificação da quimioterapia para pacientes com câncer de pâncreas metastático, com o argumento de preservar a qualidade de vida minimizando a toxicidade cumulativa relacionada ao tratamento.

"É um estudo importante e que na verdade consolida aquilo que a gente já faz na prática clínica: proteger os pacientes da neuropatia da oxaliplatina, sem comprometer o benefício clinico do tratamento contra o câncer. Essa é uma estratégia que veio do tratamento do câncer colorretal e agora a gente tem dados de segurança para o paciente com câncer de pâncreas", diz Weschenfelder. "O estudo mostra muito bem tudo aquilo que era esperado em termos de qualidade de vida, iluminando essa questão da neuropatia cumulativa, que provavelmente é pela dose mais significativa que os pacientes receberam no braço controle, mas a mensagem principal é que a gente não precisa manter tratamento pleno nos pacientes para garantir benefício a longo prazo, pode introduzir a oxaliplatina se possível no futuro", analisa. "Talvez um comentário como ajuda na prática clínica para os colegas oncologistas é que nesse estudo foi retirado tanto a oxaliplatina quanto o irinotecano, fazendo a manutenção apenas com 5-fluorouracil e leucovorina, enquanto na prática clínica muitas vezes apenas retirando a oxaliplatina a gente já consegue um benefício na qualidade de vida dos pacientes, mantendo o irinotecano especialmente para aqueles com grande volume de doença, cenário que desperta um pouco mais de preocupação em retirar todas as drogas. Então essa seria uma alternativa intermediária e que também é muito bem vista na prática clínica", acrescenta o especialista.

Referência: Randomized Phase II Trial Evaluating Two Sequential Treatments in First Line of Metastatic Pancreatic Cancer: Results of the PANOPTIMOX-PRODIGE 35 Trial - Laetitia Dahan et al - DOI: 10.1200/JCO.20.03329 Journal of Clinical Oncology - Published online July 21, 2021.