Consumo de café e sobrevida no câncer colorretal avançado

vania anaelisaChristopher Mackintosh, da Mayo Clinic, é primeiro autor de estudo que discute a associação entre o consumo de café e a sobrevida de pacientes com câncer colorretal avançado ou metastático. A conclusão dos autores está em artigo no JAMA Oncology e indica que o aumento da ingestão de café está associado a um menor risco de progressão da doença e morte. A nutricionista Ana Elisa Anjos (na foto, à esquerda) e a nutróloga Vânia Assaly analisam os resultados.

“O café é uma mistura de vários compostos bioativos, dentre eles a cafeína, o ácido clorogênico e os diterpenos, melanoidinas e mais de 1000 compostos com ação na regulação epigenética”, afirma a nutróloga Vânia Assaly.

Neste estudo de coorte prospectivo foram incluídos 1171 pacientes com câncer colorretal localmente avançado ou metastático sem tratamento prévio, inscritos em ensaio de Fase III do Cancer and Leukemia Group B (Alliance)/SWOG 80405. Os pacientes relataram a ingestão de café por meio de um questionário semiquantitativo de frequência alimentar no momento da inscrição. Os principais endpoints foram sobrevida global (SG) e sobrevida livre de progressão (SLP). Os dados foram coletados de 27 de outubro de 2005 a 18 de janeiro de 2018 e analisados de 1º de maio a 31 de agosto de 2018.

Resultados

Entre os 1171 pacientes incluídos na análise (694 homens, com idade mediana de 59 anos), o tempo médio de acompanhamento de pacientes vivos foi de 5,4 anos. Um total de 1.092 pacientes (93%) morreram ou tiveram progressão da doença.

O aumento do consumo de café foi associado à diminuição do risco de progressão do câncer ( [HR=0,95 para o aumento de 1 xícara / dia (IC de 95%, 0,91-1,00); P = 0,04) e morte (HR=0,93 para aumento de 1 xícara / dia (IC de 95%, 0,89-0,98); P = 0,004). Os participantes que consumiram 2 a 3 xícaras de café por dia tiveram uma HR multivariável para SG de 0,82 (IC 95%, 0,67-1,00) e para SLP de 0,82 (IC 95%, 0,68-0,99), em comparação com aqueles que não beberam café. Os participantes que consumiram pelo menos 4 xícaras de café por dia tiveram um HR multivariável para SG de 0,64 (IC 95%, 0,46-0,87) e para SLP de 0,78 (IC 95%, 0,59-1,05). “Associações significativas foram observadas para o café com cafeína e descafeinado”, acrescenta a publicação.

Segundo Ana Elisa, coordenadora da área de nutrição do Hospital Amaral Carvalho, em Jaú (SP), estudos sugerem que a cafeína tem papel hipoglicemiante, agindo na redução da absorção de glicose e reduzindo o risco de desenvolvimento do diabetes mellitus tipo 2. “O ácido clorogênico atua sobre o GLP1, melhorando a tolerância à glicose por meio de efeitos sobre a secreção dos hormônios incretina; as quinidas parecem ter o efeito no aumento da sensibilidade à insulina; o ácido quínico, assim como a trigonelina, também desempenham melhora no metabolismo da glicose”, explica.

A especialista observa que mesmo o café descafeinado apresenta relação inversa com o diabetes, melhorando a tolerância à glicose, atrasando a absorção da glicose intestinal e desencadeando o efeito antioxidante no organismo. “O efeito protetor do café contra câncer colorretal pode ser atribuído não somente pela cafeína, que atua como inibidora do crescimento de células tumorais do cólon, pois os diterpenos, presentes no café descafeinado também mostraram este papel protetor. O ácido clorogênico regula o estresse oxidativo e condições de estresse inflamatório, tendo o potencial de prevenir o aparecimento de alguns tumores como mama, próstata, cólon, fígado, pele, entre outros”, diz.

Assaly acrescenta que já foi demonstrado que os diterpenos do café apresentam efeito antitumoral em alguns tipos de câncer, como cólon e fígado. “Os polifenóis podem reduzir a quantidade de radicais livres, a produção de moléculas de inflamação, além d a resistência à insulina. Por todos estes mecanismos e por sua ação na regulação do ciclo celular, é conhecido como um alimento funcional com atividade quimiopreventiva”, esclarece.

A nutróloga cita estudo de pesquisadores de Harvard publicado na Gastroenterology (Gastroenterology. 2018; 154: 916-926), que aponta que o consumo de 4 xícaras de café ao dia atua tanto na prevenção do câncer colorretal como na redução de mortalidade em pacientes com câncer de a doença em estádio III. “Os pesquisadores atribuem os efeitos benéficos do consumo de café à sua atividade reguladora da microbiota intestinal, assim como pelo seu efeito benéfico na motilidade e peristaltismo intestinal”, afirma.

Referência: Mackintosh C, Yuan C, Ou F, et al. Association of Coffee Intake With Survival in Patients With Advanced or Metastatic Colorectal Cancer. JAMA Oncol. Published online September 17, 2020. doi:10.1001/jamaoncol.2020.3938