AACR: biopsia líquida no câncer renal inicial e em tumores do SNC

daniel carvalho bxDaniel de Carvalho (foto), professor associado na Faculdade de Medicina da Universidade de Toronto e pesquisador sênior no Princess Margaret Cancer Centre, apresentou na Sessão Plenária do AACR Virtual Annual Meeting II os resultados de uma abordagem de biópsia líquida (cfMeDIP-seq) capaz de detectar o carcinoma de células renais em estágio inicial e distinguir tumores clinicamente relevantes do sistema nervoso central. Os resultados foram publicados na Nature Medicine.

Denominado imunoprecipitação de DNA metilado livre de células e o sequenciamento de alto rendimento (cfMeDIP-seq), o método recupera e perfila fragmentos de DNA metilados do plasma, e pode ser usada para detectar e discriminar tumores intracranianos comuns de maneira não invasiva, alguns deles com linhagens de células de origem semelhantes1.

Os resultados demonstraram alta sensibilidade e capacidade discriminativa nos modelos para classificar gliomas entre pacientes com câncer e saudáveis ​​(área sob a curva (AUC) = 0,99, 95% CI = 0,96-1,00;), com desempenho semelhante no glioma IDH mutado ( AUC = 0,992; 95% CI = 0,949-1.000) e gliomas IDH selvagem (AUC = 0,993; 95% CI = 0,966-1.000), bem como em gliomas de alto grau (AUC = 0,983, 95% CI = 0,903-1.000).

Os autores também procuraram determinar se os perfis de plasma cfMeDIP-seq poderiam ser usados ​​para distinguir ainda mais os tumores intracranianos. Para isso, foram gerados perfis cfMeDIP-seq em 161 amostras adicionais, normalmente incluídas no diagnóstico diferencial de tumores extra-axiais (meningiomas, hemangiopericitomas) e tumores intra-axiais (tumores glial-neuronais de baixo grau, gliomas IDH mutado, gliomas IDH selvagem e metástases cerebrais de cânceres sistêmicos). A avaliação indica discriminação confiável de tumores extra-axiais comuns (AUC do meningioma vs outros = 0,89, 95% CI = 0,80-0,97; AUC do hemangiopericitoma vs outros = 0,95, 95% CI = 0,73-1,00), bem como tumores intra-axiais, variando de tumores glial-neuronais indolentes de baixo grau (AUC = 0,93, 95% CI = 0,80–1,00) para gliomas intra-axiais difusos com composição molecular distinta (AUC do glioma IDH mutado vs outros = 0,82, 95% CI = 0,66-0,98; AUC do glioma IDH selvagem vs outros = 0,71, 95% CI = 0,53-0,90).

“Estes resultados demonstram o potencial dos perfis cfMeDIP-seq não apenas para detectar ctDNA, mas também para discriminar tumores com linhagens de células de origem semelhantes”, observou Carvalho.

O pesquisador acrescenta que a evidência para a detecção do ctDNA plasmático apresentada pode ter implicações de mudança de prática no diagnóstico e tratamento de lesões intracranianas. “A biópsia líquida pode reduzir a necessidade de procedimentos invasivos para estabelecer o diagnóstico quando a citorredução não é necessária ou quando os riscos de cirurgia invasiva superam os benefícios. Além disso, para tumores que se beneficiam da citorredução, o conhecimento do diagnóstico antes da cirurgia pode melhorar o planejamento e a segurança neurocirúrgicos”, esclarece.

Diagnóstico precoce do carcinoma de células renais em estágio inicial

O segundo estudo apresentado avaliou a eficácia do cfMeDIP – seq para detecção de carcinoma de células renais (CCR), com ênfase na doença em estágio inicial.2

Atualmente, não existe um biomarcador não invasivo clinicamente validado para a detecção de câncer renal. “Embora a capacidade de identificar o cfDNA derivado do tumor em pacientes com câncer metastático seja estabelecida, agora estão surgindo ensaios com sensibilidade suficiente para detectar doenças localizadas”, avalia Carvalho. “Um teste não invasivo com alta acurácia, sensibilidade e especificidade, isolado ou em combinação com métodos de imagem, pode transformar o tratamento clínico, permitindo a detecção precoce do carcinoma de células renais e reduzindo biópsias e nefrectomias desnecessárias”, observa.

Os pesquisadores realizaram cfMeDIP – seq em 148 amostras: 99 casos de carcinoma de células renais estádio I – IV; 21 amostras de câncer urotelial de bexiga (UBC) estádio IV de 15 pacientes; e 28 controles saudáveis. 33,3% das amostras de plasma e 66,7% das amostras de urina vieram de pacientes com doença estágios I ou II (Classificação TNM).

Os resultados demonstraram uma classificação acurada de pacientes em todos os estágios do carcinoma de células renais (CCR) no plasma (área sob curva característica de operação do receptor - AUROC de 0,99; 95% CI 0,985– 0,995); além disso, os autores também demonstraram a validade do ensaio para identificar pacientes com CCR através do DNA livre de células na urina (AUROC de 0,86).

Para avaliar o desempenho da classificação entre diferentes tumores geniturinários, os autores realizaram a mesma análise comparando pacientes com carcinoma de células renais e carcinoma urotelial de bexiga, resultando em um AUROC médio de 0,979 (95% CI 0,956-0,991). As mesmas análises foram realizadas no cfDNA na urina de pacientes com CCR e controles saudáveis. A média AUROC de 100 conjuntos de treinamento-teste foi de 0,858 (95% CI 0,831-0,885). “Dada a facilidade de amostragem clínica de rotina, o cfDNA na urina é uma fonte atraente para a detecção não invasiva do câncer”, destaca o pesquisador.

Embora a classificação baseada na urina não seja tão precisa quanto a classificação baseada no plasma, os autores destacam que o desempenho pode ser melhorado por meio de otimização técnica e computacional, como a seleção do tamanho do cfDNA para enriquecer o DNA derivado do tumor e a utilização de dados de metilação do tumor para informar a metilação da análise do cfDNA.

“Após a aplicação em conjuntos de dados maiores e a validação prospectiva, esse método poderia reduzir a morbimortalidade por meio da detecção precoce e precisa do carcinoma de células renais e de outros tumores”, conclui Carvalho.

Referências: 

1 - Nassiri, F., Chakravarthy, A., Feng, S. et al. Detection and discrimination of intracranial tumors using plasma cell-free DNA methylomes. Nat Med (2020). https://doi.org/10.1038/s41591-020-0932-2

2 - Nuzzo, P.V., Berchuck, J.E., Korthauer, K. et al. Detection of renal cell carcinoma using plasma and urine cell-free DNA methylomes. Nat Med (2020). https://doi.org/10.1038/s41591-020-0933-1