CAR T Cells em mieloma múltiplo e as lições para a pesquisa translacional

Martin Bonamino NET OKTerapias CAR T Cells com o receptor quimérico de antígeno (CAR) anti-CD19 têm demonstrado resultados encorajadores em leucemias e linfomas. Agora, dados iniciais do ensaio CRB- 401 também mostraram respostas em pacientes com mieloma múltiplo, sugerindo o antígeno de maturação de células B (BCMA) como importante alvo terapêutico. Os resultados foram recentemente publicados por Raje, N et al no New England Journal of Medicine. Martín Bonamino (foto), pesquisador do Instituto Nacional de Cancer (INCA) e da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), comenta os resultados.

A proteína CD19, um alvo clássico de CARs, não é tipicamente expressa na membrana plasmática de células do mieloma múltiplo (MM). Estas células expressam, no entanto, um marcador de células B diferente, o BCMA, expresso nas células de MM. Dados iniciais dos primeiros 33 pacientes de MM tratados com CAR T Cells anti BCMA mostraram 85% de resposta objetiva e 45% de resposta completa em pacientes politratados, que haviam recebido uma mediana de 7 linhas prévias de terapia.

Em um acompanhamento de mediana de 11,3 meses (mínimo de 6,2 meses), a sobrevida média livre de progressão foi de 11,8 meses; aproximadamente 40% dos respondedores tinham doença em progressão e apresentaram taxas semelhantes entre os pacientes com resposta completa ou doença residual mínima negativa.

Embora a taxa de resposta tenha sido muito favorável, a maioria destas respostas não foi mantida, alerta D. Killock, que não esteve envolvido no estudo e analisa os resultados em um comentário publicado no Nature Reviews Clinical Oncology. “Os resultados obtidos precisam ser vistos com cautela. É importante destacar que dos 16 pacientes com resposta e que foram avaliados para doença residual mínima, todos tiveram resultados negativos, com sensibilidade de ≤10−4”, destaca.

Além disso, as toxicidades não foram desprezíveis e 97% dos pacientes apresentaram pelo menos um evento adverso grau ≥3, predominantemente hematológico, inclusive neutropenia em 85% dos pacientes. A síndrome de liberação de citocinas ocorreu em 76% dos pacientes (grau 3 em 6%) e eventos neurológicos em 42%. “Esses dados são promissores, mas enfatizam o valor da pesquisa translacional em andamento para melhorar não só a eficácia, mas também a segurança das terapias com CAR T Cells”, conclui Killock. 

Para Bonamino, o estudo indica que a terapia CAR-T contra o BCMA é capaz de induzir a remissão em uma fração muito representativa dos pacientes, especialmente quando altas doses das células CAR-T são usadas. “Uma fração importante dos pacientes que entraram em remissão voltou a apresentar a doença. Estudos devem ser realizados para compreender melhor os mecanismos que levam a estas recaídas e se modificações nesta terapia podem evitar este fenômeno”, observa.

“Em todo caso, o BCMA parece estar se consolidando como um alvo terapêutico relevante para a terapia CAR-T em mieloma múltiplo, o que representa uma ótima notícia”, acrescenta o especialista.

Referências:

Killock, D. (2019). Anti-BCMA CAR T cells for MM. Nature Reviews Clinical Oncology. doi:10.1038/s41571-019-0229-x

Raje, N. et al. Anti-BCMA CAR T-cell therapy bb2121 in relapsed or refractory multiple myeloma. N. Engl. J. Med. 380, 1726–1737 (2019)