Vitamina D e redução do risco de câncer de pulmão

RIAD NET OK 2Estudo da Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC) publicado online no Annals of Oncology não demonstrou associação entre os níveis circulantes de vitamina D e redução do risco de câncer de pulmão. Este é o maior estudo observacional até o momento sobre a relação entre a vitamina D e o câncer, com uma análise de mais de 5300 casos e controles em 20 estudos internacionais de coorte prospectivos participantes do Lung Cancer Cohort Consortium (LC3). O cirurgião Riad Younes (foto), Diretor Geral do Centro de Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, comenta os resultados.

O papel da vitamina D na proteção contra o câncer de pulmão tem sido um tópico de debate, com estudos anteriores, menores, sugerindo que altas concentrações de vitamina D poderiam proteger contra o câncer de pulmão. O presente estudo teve como objetivo fornecer uma resposta precisa e definitiva sobre se a associação entre os níveis circulantes de vitamina D e o risco de câncer de pulmão.

"Os resultados baseiam-se nos dados mais abrangentes disponíveis e mostram claramente nenhuma associação entre altas concentrações de vitamina D e risco de câncer de pulmão", diz Paul Brennan, principal investigador do estudo. "Nossos resultados são importantes porque muitas estratégias de prevenção ainda se concentram na suplementação de vitamina D como uma medida de proteção contra várias doenças, incluindo o câncer de pulmão”, acrescentou.

O estudo incluiu 5313 casos de câncer de pulmão e 5313 controles. Amostras de sangue para os casos foram coletadas, em média, 5 anos antes do diagnóstico de câncer de pulmão. Os controles foram pareados individualmente aos casos por coorte, sexo, idade, raça/etnia, data da coleta de sangue e status de tabagismo em cinco categorias.

Ao invés de se basear apenas nas informações de tabagismo autorreferidas (como estudos anteriores), este estudo incluiu uma análise da cotinina (um metabólito da nicotina encontrado no sangue), que forneceu uma medida objetiva da exposição recente ao tabaco. Os dados também incluem estimativas robustas sobre a vitamina D e câncer de pulmão entre ex-fumantes e não-fumantes.

A cromatografia líquida acoplada com espectrometria de massa em tandem foi usada para analisar separadamente 25-hidroxivitamina D2 [25(OH)D2] e 25-hidroxivitamina D3 [25(OH)D3] e suas concentrações foram combinadas para dar uma medida global de 25 (OH)D.

No geral, nenhuma associação aparente entre 25 (OH)D e risco de câncer de pulmão foi observado (OR ajustado multivariável para uma duplicação na concentração: 0,98, 95% IC: 0,91, 1,06). Da mesma forma, não foram encontradas evidências claras de interação por coorte, sexo, idade, status de tabagismo ou histologia.

"Apesar de estudos anteriores menores sugerirem que altas concentrações de vitamina D poderiam proteger contra o câncer de pulmão, esses novos resultados não apoiam a ideia de suplementação de vitamina D para a prevenção primária do câncer de pulmão", afirmou Christopher Wild, diretor da IARC. "Dada a alta incidência da doença, é vital priorizar os esforços para reduzir o tabagismo e identificar medidas preventivas adicionais que possam ajudar a reduzir o risco", concluiu.

Papel preventivo da vitamina D no câncer de pulmão

Riad Younes*

Na última década, vários estudos foram publicados avaliando a correlação entre vitamina D e a incidência de tumores malignos, entre eles os tumores colorretais e de pulmão. Meta-análises relatadas recentemente mostraram uma tendência de associação inversa entre níveis séricos de vitamina D e câncer de pulmão, com redução do risco de câncer de pulmão em indivíduos com concentração elevada de vitamina D estimada em 17%. Problemas muito frequentes inerentes às meta-análises limitam sua capacidade de trazer definições conclusivas sobre esta questão, apesar do potencial de gerar hipóteses muito interessantes.

Para tentar resolver estas limitações, um grupo de pesquisadores do Lung Cancer Cohort Consortium, liderados por DC Muller e incluindo instituições europeias, australianas, norte-americanas e asiáticas, realizou um estudo prospectivo extenso que avaliou a correlação entre os níveis circulantes de vitamina D e o risco de câncer de pulmão (Ann Oncology Abril 2018).

Os autores estudaram 10616 pessoas incluídas no protocolo, cujas amostras de sangue foram colhidas e armazenadas antes (em média 5 anos) do diagnóstico de tumor maligno no pulmão. Os grupos com e sem câncer de pulmão forma balanceados quanto às características clínicas e fatores de risco. As concentrações de 25-hidroxivitaminas D2 e D3 nestas amostras foram dosadas. Após análises estatísticas, os autores não encontraram correlação entre a concentração de vitamina D e redução de risco de câncer de pulmão (OR: 0,98 - C 95%: 0,91, 1,06).

O estudo apresenta sólidas evidências para a ausência de associação entre níveis séricos de vitamina D (em suas várias formas) e a ocorrência de câncer de pulmão, tendo em vista a qualidade de metodologia empregada, e a redução de chances de viés na amostragem: análise bioquímica em laboratório central único, em amostras de sangue pré-colhidas e armazenadas no protocolo, inclusão de análise das vitaminas D, e o agrupamento categórico em diferentes níveis considerados normais ao redor do mundo. Apesar de todas estas correlações matemáticas, os autores não encontraram evidências do impacto protetor de vitamina D contra câncer de pulmão.

Baseado neste estudo, não há, até o momento, indicação para suplementar os indivíduos, independente de sua exposição a fatores de risco (tabagismo, p.e.) com maiores doses de vitamina D com a intenção de reduzir seu risco de desenvolver tumores malignos de pulmão. Vários estudos prospectivos com suplementação vitamínica estão sendo atualmente realizados, e seus resultados serão aguardados para confirmar, ou não, um eventual papel preventivo da vitamina D em câncer.

*Riad Younes é cirurgião oncológico e Diretor Geral do Centro de Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz

Referência:  Muller DC, Hodge AM, Fanidi A, Albanes D, Mai XM, Shu XO, et al. (2018). No association between circulating concentrations of vitamin D and risk of lung cancer: an analysis in 20 prospective studies in the Lung Cancer Cohort Consortium (LC3). Ann Oncol. Published online 2 April 2018. http://dx.doi.org/10.1093/annonc/mdy104