Prevenção do HPV e controle do câncer

LUISA NET OKO Dia Internacional de Conscientização do HPV, comemorado mundialmente pela primeira vez neste 4 de março, quer reforçar o alerta global para a infecção pelo papilomavírus humano (HPV), responsável pelo desenvolvimento de diferentes tipos de câncer. Quem fala com propriedade do valor da prevenção é a bióloga Luisa Lina Villa (foto), primeira autora do artigo publicado no Lancet em abril de 2005, que embasou o registro da vacina contra o HPV nos cinco continentes. Agora, Luisa pede o empenho da comunidade médica e de outros profissionais da Saúde para avançar no desafio de erradicar os cânceres HPV-dependentes.

“O envolvimento do profissional de saúde é fundamental. Uma das grandes dificuldades na conscientização sobre o HPV é que, muitas vezes, esse profissional não se engajou na proposta com o afinco que deveria. Por isso tentamos divulgar informações, responder questionamentos, mas é preciso tempo para atingir a massa crítica necessária, para que esse profissional se sinta realmente envolvido”, afirma Luisa, chefe do Laboratório de Inovação em Câncer do Icesp e pesquisadora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

A vacinação é um importante aliado para a prevenção contra o HPV, indicada para proteger contra quatro tipos diferentes de vírus, dentre os quais os tipos 6 e 11, que geralmente causam verrugas genitais, e os tipos 16 e 18, principais responsáveis pelas lesões precedem o câncer. Está disponível no SUS, gratuitamente, para meninas de 9 a 14 anos e meninos de 11 a 14 anos. O impacto é dramático: quase erradicação de verrugas genitais nos países que introduziram a vacina com altas coberturas há mais de cinco anos, além da redução de mais de 60% das lesões precursoras de câncer entre as jovens.

"Temos que continuar empenhados em ampliar a cobertura da vacinação contra HPV entre meninas e meninos. Os médicos têm um papel fundamental neste processo, ao indicar a vacinação, e demais profissionais da saúde, ao veicular informações corretas à população", afirma a pesquisadora.” É nosso papel conscientizar as pessoas sobre o assunto e abordar a importância do autocuidado na prevenção do vírus e doenças relacionadas”, esclarece.

Hoje, 85% das mortes por câncer cervical ocorrem em países pobres ou em desenvolvimento. Ao lado da vacinação, o rastreamento para identificar lesões precursoras continua como a melhor estratégia, mas a realidade está longe do esperado. Diante da ausência de políticas em diferentes regiões do planeta ou de estratégias pouco efetivas no combate ao HPV, o cenário preocupa. "O Papilomavirus humano (HPV) é o causador da infecção sexualmente transmissível mais comum no mundo. Estima-se que 80% da população sexualmente ativa já tenha entrado em contato com o vírus alguma vez na vida”, explica Luisa. No Brasil, excetuando o câncer de pele não-melanoma, o câncer do colo do útero já se sobrepõe ao de mama como a primeira causa de morte por câncer entre a população feminina nas regiões mais carentes do país. O câncer de orofaringe HPV dependente também preocupa, hoje em evolução.

Campanha

Para chamar a atenção da população sobre prevenção e diagnóstico precoce, o uso de preservativo em qualquer tipo de relação sexual, a ligação do vírus com diversos tipos de câncer e a vacinação para crianças na rede pública, o ICESP lançou a campanha #TragoVerdadesDoHPV. A ação é parte da campanha mundial #givelovenothpv, liderada pela International Papillomavurus Society.

“A mensagem da prevenção contra a infecção pelo papilomavírus é para todos, independe de gênero, idade e orientação sexual", observa a especialista, ressaltando a importância da divulgação da vacinação também em meninos. “Apesar da ausência de dados oficias, o que temos notado é que a adesão à vacina em meninos ainda é discreta, fruto do desconhecimento das doenças que o HPV pode causar nos homens. O gênero masculino participa não só de toda a cadeia de transmissão, mas também pode apresentar doenças decorrentes da infecção, como o câncer de orofaringe, por exemplo. Se conseguirmos vacinar meninas e meninos, o benefício será ampliado. Alguns países já começam a detectar essa tendência das curvas serem mais íngremes com a vacinação em crianças e adolescentes de ambos os sexos”, diz.

Segundo Luiza, apesar do caráter geral da campanha, é importante também ressaltar a importância da vacinação em determinados grupos, como os pacientes HIV-positivos. “A taxa de vacinação de pessoas HIV-positivos, que têm vacinação recomendada e gratuita oferecida pelo Ministério da Saúde até 26 anos de idade, é muito baixa. É como se não houvesse conhecimento ou qualquer recomendação. A exceção é o Centro de Referência e Treinamento DST/Aids de São Paulo, que tem feito um trabalho importante”, diz.

E mesmo que a vacinação seja mais eficiente em pessoas que ainda não iniciaram sua vida sexual e, portanto, não se expuseram ao vírus, qualquer pessoa, mesmo que já tenha tido múltiplos parceiros, pode ser beneficiada, uma vez que pode não ter sido infectada pelos 4 tipos de HPV. Estudos epidemiológicos mostram que as pessoas geralmente se infectam por 1 ou 2 tipos de HPV. Então, o benefício existe, ainda que a eficácia, quando comparada a crianças e adolescentes, gire em torno de 40% a 50%”, conclui.