Exercício pré-operatório no câncer de pulmão

RIAD NET OKA prática de exercícios físicos no pré-operatório reduz as taxas de complicações pós-operatórias e a duração da internação em pacientes com câncer de pulmão. É o que mostram resultados da meta-análise que avaliou dados de 13 estudos envolvendo 806 pacientes (idade média, 63,3 anos) com seis diferentes tipos de tumor primário. Quem comenta é o cirurgião torácico Riad Younes (foto), diretor geral do Centro de Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.

Para pacientes submetidos à ressecção hepática de câncer colorretal ou cirurgia de câncer de cólon, esôfago, câncer oral e próstata, a eficácia do exercício pré-operatório foi incerta devido à baixa qualidade das evidências disponíveis e ao limitado número de estudos. No entanto, evidências de qualidade moderada mostraram que entre 432 pacientes com câncer de pulmão de cinco estudos clínicos randomizados e 1 estudo clínico controlado, o exercício pré-operatório reduziu as taxas de complicações pós-operatórias (risco relativo, 0,52; intervalo de confiança de 95%, 0,36-0,74) e duração da internação (redução mediana de 2,86 dias, IC 95%, 0,33-5,40 dias).

A maioria dos estudos analisados na coorte de pulmão incluiu exercícios de musculação, exercícios aeróbicos e respiratórios durante 1 a 2 semanas antes da cirurgia, com frequência variando de três vezes por semana a três sessões diárias. Estudos com mais sessões de atividade física apresentaram maior benefício.

Para os autores, este estudo apoia a hipótese de que o exercício pré-operatório beneficia pacientes submetidos à cirurgia de câncer de pulmão. Além de melhorar a qualidade de vida dos pacientes, há uma possível redução de custos diante do menor tempo de internação hospitalar e da menor necessidade de tratamento de complicações pós-operatórias.

“Com base neste e em outros estudos, a prática padrão deve incorporar 1 a 2 semanas de exercício muscular aeróbico e respiratório antes das ressecções pulmonares. Estudos adicionais devem se concentrar na definição de um pré-operatório ótimo”, recomendam os autores.

Referência: Steffens D et al. Preoperative exercise halves the postoperative complication rate in patients with lung cancer: A systematic review of the effect of exercise on complications, length of stay and quality of life in patients with cancer. Br J Sports Med 2018 Feb 1; [e-pub]. (https://doi.org/10.1136/bjsports-2017-098032).

Exercícios físicos pré-operatórios reduzem risco de complicações cirúrgicas em pacientes com câncer de pulmão

*Por Riad Younes

Apesar dos avanços indiscutíveis da técnica cirúrgica, da instrumentação e dos equipamentos disponíveis ao cirurgião e ao anestesista, e à grande evolução dos cuidados peri-operatórios, observamos ainda taxas de complicações pós-operatórias que variam entre 10% e 50%, e de mortalidade entre 1% e 20%, a depender da extensão da ressecção pulmonar (de segmentectomia a pneumectomia).

Técnicas cirúrgicas minimamente invasivas (videotoracoscopia, p.e.) representaram um salto significativo na redução dos riscos cirúrgicos, e uma evolução pós-operatória mais benigna e acelerada. Por outro lado, os cuidados clínicos e a seleção mais apurada de pacientes com risco operatório mais aceitável ajudaram a diminuir ainda mais a ocorrência de complicações.

Uma área que tem recebido uma maior atenção recentemente é a introdução de programas de reabilitação cardiopulmonar e muscular perioperatória, com relatos de impactos favoráveis em cirurgias de grande porte, como hepatectomias ou ressecções extensas de tumores abdomino-perineais. Oncologistas torácicos e cirurgiões têm debatido o real papel dos exercícios físicos orientados no preparo pré-operatório.

Um recente estudo de metanálise publicado na revista British Journal of Sports Medicine por cientistas liderados por Daniel Steffens, da Universidade de Sidnei, Austrália (nenhum conflito de interesse foi declarado pelos autores), revisou as evidências acumuladas em estudos previamente publicados sobre o impacto dos exercícios físicos pré-operatórios na incidência de complicações pós-cirúrgicas, a duração da internação hospitalar e a qualidade de vida, em pacientes com vários tipos de câncer.

Foram analisados os resultados de 13 estudos envolvendo 806 pacientes portadores de seis diferentes tipos de tumores primários. Os pesquisadores observaram que para o grupo de pacientes submetidos à ressecção hepática, ou cirurgias de câncer de cólon, esôfago, cabeça e pescoço, ou próstata, a eficácia do exercício pré-operatório em reduzir o risco de morbidade pós-operatória foi incerta, principalmente devido à baixa qualidade das evidências disponíveis e ao limitado número de estudos.

No entanto, quando analisaram separadamente os resultados publicados em 432 pacientes com câncer de pulmão (cinco estudos randomizados e um estudo controlado), o exercício pré-operatório reduziu em 48% o risco de complicações pós-operatórias (risco relativo: 0,52; IC 95%: 0,36-0,74), assim como diminuiu significativamente a duração de internação hospitalar pós-cirúrgica (redução mediana: 2,86 dias, 95% IC: 0,33-5,40 dias). Nestes estudos, os pacientes foram submetidos a exercícios de musculação, exercícios aeróbicos e respiratórios durante 1 a 2 semanas antes da cirurgia, com frequência variando de três vezes por semana a três sessões diárias. Estudos com mais sessões de atividade física apresentaram maior benefício.

Os autores concluíram que “os resultados da revisão sistemática e metanálise favorecem a hipótese de que o exercício pré-operatório beneficiaria pacientes submetidos à cirurgia de ressecção de câncer de pulmão. Além de melhorar a qualidade de vida dos pacientes, há uma possível redução de custos diante do menor tempo de internação hospitalar e da menor necessidade de tratamento de complicações pós-operatórias. Com base neste e em outros estudos, a prática padrão deve incorporar 1 a 2 semanas de exercício muscular aeróbico e respiratório antes das ressecções pulmonares. Estudos adicionais mais sólidos, prospectivos e randomizados, devem ser realizados para definir o impacto de programas de exercícios pré-operatórios em cirurgias oncológicas de grande porte”.

Como todos os estudos de revisão e de metanálise, os resultados apresentados deverão ser interpretados com cautela. Os próprios autores identificaram que a metade dos estudos apresentava elevado risco para viés (bias) na sua metodologia.

Os estudos incluídos na metanálise que se referem às cirurgias torácicas foram realizados em diferentes épocas, com técnicas operatórias mais convencionais. Não há evidências suficientes sobre o real benefício do exercício físico pré-operatório na evolução em pacientes submetidos a cirurgias minimamente invasivas, mais atuais. Alguns dos estudos incluídos, por outro lado, tinham poucos pacientes em cada braço, tornando sua interpretação mais difícil e sua aplicação na prática ainda limitada.

De qualquer forma, em nosso serviço orientamos todos nossos pacientes a abandonarem o tabagismo, cuidarem de sua nutrição, e se engajarem em atividade física aeróbica por pelo menos duas semanas antes da cirurgia torácica, mantendo este programa por mais 4-6 semanas após a alta hospitalar.

Após este estudo, aguardamos pesquisas com desenho experimental mais robusto para definitivamente incorporar programas estruturados e eficientes, se possível individualizados para cada paciente.

*Riad Younes é cirurgião torácico, professor livre-docente da Faculdade de Medicina da USP e diretor geral do Centro de Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo