Radioterapia adjuvante em glioblastoma

Robson_Ferrigno_NET_OK.jpgCrescem as evidências de que o hipofracionamento oferece benefício de sobrevida em relação ao fracionamento padrão (60 Gy em 30 frações ao longo de 6 semanas)  em pacientes de glioblastoma com idade avançada e pior performance status. O radio-oncologista Robson Ferrigno (foto), Coordenador dos Serviços de Radioterapia do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes (COAEM), comenta com exclusividade para o Onconews editorial publicado no Neuro-Oncology. Afinal, qual o regime ideal nesse perfil de pacientes?

Brian Michael Alexander, do Departamento de Radioterapia do Dana-Farber e do Brigham and Women's Cancer Center, questiona que evidências realmente suportam o hipofracionamento nesse perfil de pacientes, em editorial publicado na edição de fevereiro do Neuro-Oncology. Cursos abreviados de RT derivaram da hipótese de que essa população de doentes não pode se beneficiar de uma terapia mais agressiva, obtendo nesse contexto maior qualidade de vida com o hipofracionamento.  
 
Radioterapia adjuvante em glioblastoma
 
O Editorial publicado no periódico Neuro Oncology por Brian Michael Alexander é um texto bastante oportuno uma vez que aborda uma estratégia de radioterapia conveniente, conhecida como regime hipofracionado (aumento de dose por fração no tumor e menor tempo de tratamento), para pacientes com tumores cerebrais tipo histológico glioblastoma multiforme.
 
O glioblastoma multiforme é classificado como glioma de alto grau e é extremamente agressivo, uma vez que sempre recidiva no local tratado, levando o paciente à deterioração neurológica e morte em espaço curto de tempo. O grande desafio de cirurgiões, radio oncologistas e oncologistas clínicos sempre foi utilizar uma estratégia que evite essa recidiva local. A ressecção cirúrgica completa, o emprego da radioterapia e a associação com quimioterapia oral baseada em temozolomida são as três estratégias que aumentaram a sobrevida desses pacientes, porém, ainda muito longe de oferecer um tempo e qualidade de vida razoável para eles.
 
Baseados nos estudos publicados, o tratamento padrão nos dias de hoje é a combinação de cirurgia mais radical possível, seguida de associação de radioterapia com quimioterapia oral com temozolomida concomitante e adjuvante à radioterapia. A dose padrão de radioterapia é de 60 Gy liberada em 30 frações diárias de 2 Gy, cinco vezes por semana. Estudos de escalonamento de dose com a mesma dose por dia foram negativos para melhorar os resultados de sobrevida desses pacientes. Esse é o fracionamento que foi utilizado pelo estudo do EORTC que mostrou o benefício do emprego da associação de temozolamida com a radioterapia, publicada por Stupp R e colaboradores no periódico New England of Medicine em 2005.
 
Os estudos citados no editorial tiveram como objetivo principal mostrar não inferioridade de resultados comparando regimes de fracionamento de radioterapia mais curtos com o fracionamento padrão de 30 dias úteis. Utilizar regimes em 15 dias úteis (15 x 2,67 = 40 Gy) ou em 10 dias úteis (10 x 3,4 Gy = 34 Gy) não possui resultados inferiores com relação ao regime de 30 dias úteis, demonstrado por estudos randomizados e citados no Editorial.
 
A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), sediada em Viena, na Áustria, conduziu um estudo randomizado comparando dois regimes de hipofracionamento (15 x 2,67 Gy com 5 x 5 Gy), ou seja, diminuição do tempo de tratamento de 15 dias úteis (três semanas) para cinco dias úteis (uma semana) para pacientes a partir de 50 anos de idade. Esse estudo foi publicado em dezembro do ano passado por Wilson Roa e colaboradores no periódico Journal of Clinical Oncology e também foi comentado no Editorial em questão. Não houve diferença estatisticamente significativa no tempo de sobrevida, sobrevida livre de progressão e qualidade de vida entre os dois regimes, sugerindo a possibilidade de tratar os pacientes com glioblastoma multiforme com apenas cinco dias de radioterapia.
 
Vale ressaltar que os principais estudos randomizados de hipofracionamento não utilizaram a associação com temozolomida. Faltam dados de segurança com a associação desse quimioterápico oral com radioterapia hipofracionada. Há apenas um estudo fase I, com poucos pacientes, publicado por Jastaniyad e colaboradores no periódico Radiation Oncology em 2013, que combinaram dois regimes de hipofracionamento com Temodal e não houve aumento de toxicidade. No entanto, isso precisa ser validado através de estudos de fase III.
 
Na prática, quando um paciente possui prognóstico mais reservado pela extensão da doença que impede ressecção cirúrgica adequada, pela impossibilidade clínica de receber Temodal ou pela idade ou performance status, utilizamos regimes hipofracionados, o mais frequente de 15 x 2,67 Gy, uma vez que essa estratégia não impacta a sobrevida desses pacientes e melhora a qualidade de vida do pouco tempo que lhes restam. Utilizar regimes ainda mais curtos de radioterapia para esses pacientes de pior prognóstico, como em 10 ou, até mesmo, em cinco dias úteis, é uma estratégia bastante razoável e respaldada pela literatura com estudos de nível 1 de evidência.
 
Para pacientes de melhor prognóstico (ressecção completa, presença de metilação do MGMT, jovens e com boa performance status), a abordagem padrão ainda é a radioterapia com regime tradicional (30 x 2 Gy) e associação com temozolomida.
 
ReferênciaRadiation de-intensification for patients with glioblastoma and poor prognostic features—how much do we really know?Neuro Oncol (2016) 18 (2): 147-148