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AtualizadoQua, 17 Abr 2024 9pm

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Daichii Sankyo

 

Microbioma e câncer, limites e oportunidades

microbioma 2 bxAo descrever os 10 anos de atividades, Consórcio do Microbioma Humano corrobora associação entre microbiota e resposta terapêutica e pede mais atenção ao papel da genética do hospedeiro.

 

Biomarcadores baseados em microbiomas para predizer o risco de câncer e bioterapêuticos para melhorar os resultados oncológicos são promessas da próxima onda de inovação. Embora a compreensão do microbioma tenha crescido exponencialmente na última década com o desenvolvimento de abordagens de sequenciamento genômico, sobram dúvidas ainda à espera de respostas. Na prática, é possível modular o microbioma e garantir respostas melhores no tratamento do câncer?

Revisão de McQuade, JL et al publicada em fevereiro de 2019 no Lancet Oncology (The Lancet Oncology, 20(2), e77–e91) discutiu evidências sobre o papel do microbioma no tratamento oncológico, destacando os estudos que relatam forte associação entre microbiota intestinal e resposta terapêutica, inclusive aos inibidores de checkpoint imune. O mais importante, destacam os autores, é lembrar que o microbioma pode ser modificado através de diferentes estratégias, o que abre novas perspectivas terapêuticas. Hoje, o transplante fecal já é uma realidade no tratamento de Clostridium difficile recorrente e está sendo usado experimentalmente para tratar doença inflamatória intestinal, doenças metabólicas e até câncer. A administração de probióticos e outras estratégias de intervenções dietéticas também fazem parte de um campo emergente, com potencial de múltiplas aplicações.

Mas afinal, que grau de disbiose influencia a capacidade de modulação da resposta imune? Como selecionar a população-alvo e potenciais doadores para estratégias destinadas a modular o microbioma? Ainda faltam respostas e a evolução das pesquisas deve certamente se concentrar em questões como essas. Por ora, a conclusão dos pesquisadores corrobora evidências convincentes de que a microbiota afeta a imunidade e a resposta terapêutica no câncer, mas não há dados para definir o padrão ótimo dessas intervenções, ainda restritas ao ambiente experimental.

“A microbiota é um consórcio de microorganismos composto de bactérias, vírus, fungos e protozoários que vivem em vários locais do corpo, incluindo cavidades orais, urogenitais e gastrointestinais, formando uma comunidade em estado eubiótico”, descreveram Pope et al em revisão publicada em 2017 (Translational Research 2017; 179: 139-154). “Componentes genéticos, ambientais e de estilo de vida, todos influenciam a composição do microbioma”, reforçam os autores.

A literatura também descreve que a maior parcela desses microorganismos reside dentro do intestino e influencia não só a função intestinal, mas tem a capacidade de exercer efeitos de longo prazo sobre a homeostase do hospedeiro, contribuindo para o desenvolvimento do sistema imune e até para manter a integridade das barreiras mucosas, modulando diferentes estados patológicos - de quadros alérgicos à obesidade; de condições neurológicas ao câncer.

“A disbiose, não apenas intestinal, pode estar envolvida na fisiopatologia de tumores do aparelho respiratório, cavidade oral, intestinal, assim como pode estar envolvida com tumores de mama, endométrio, tumores linfoides e de cabeça e pescoço”, explica a nutróloga Vânia Assaly. Na prática, significa que a microbiota é capaz de regular vários aspectos do sistema imune inato e adaptativo, podendo influenciar diretamente o processo de carcinogênese. “Alterações da microbiota estão envolvidas nos modelos metabólicos e imunológicos do câncer e podem contribuir também para a progressão do tumor”, diz a especialista. “Por outro lado, a simbiose ou eubiose participa das vias imunológicas, da biotransformação e equilíbrio de produção de ácidos graxos de cadeia curta, entre outros, que exercem benefícios na redução dos mecanismos pró- tumorais”, acrescenta a especialista.

Apontado como outra importante autoridade no assunto, Dan Waitzberg, diretor-presidente do Grupo de Nutrição Humana da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, aponta caminhos para reforçar a pesquisa. “Entre nós, no Brasil, o primeiro passo é conhecer qual é a composição da microbiota intestinal em pacientes com câncer. Será ela semelhante ao descrito nos Estados Unidos e Europa ou diferenciada devido às distintas condições climáticas, de dieta e estilo de vida brasileiros?”, indaga o especialista. “Uma vez conhecida a composição do microbioma do brasileiro poderemos iniciar pesquisas bem planejadas com intervenções nutricionais, com o objetivo de reequilibrar a microbiota alterada”, propõe o especialista, também à frente da Bioma4Me, companhia especializada no sequenciamento do exoma.

O futuro promete benefícios que não se restringem aos tumores do trato gastrointestinal. “Chama a atenção que a microbiota intestinal está alterada em diversos tipos de câncer gastrintestinal, mas também em melanoma e no câncer de pulmão”, prossegue Waitzberg. “Pacientes que respondem a inibidores de checkpoint imune têm microbiota distinta dos que não respondem ao tratamento oncológico para melanoma e câncer de pulmão”, ilustra.

Estudo de Eric Bernasconi e colegas (https://doi.org/10.1164/rccm.201512-2424OC) com 203 lavados broncoalveolares de 112 pacientes que receberam transplante pulmonar revelou que algumas bactérias exerciam um papel pró-inflamatório (gêneros Staphylococcus e Pseudomonas) enquanto outras um papel de menor estimulação do sistema imune (gêneros Prevotella e Streptococcus).

De olho em achados como esses, avança o desenvolvimento de biomarcadores baseados em microbiomas para prever o risco de doenças, entre elas o câncer. É o caso da presença de determinada população bacteriana (Parvimonas micra, Streptococcus anginosus e Proteobacterias) com potencial de predizer o câncer colorretal ou da maior presença de proteobacterias, bacteroidetes e firmicutes como biomarcador de risco para câncer de pâncreas.

E as promessas vão além. O time que analisou os 10 anos do Consórcio do Microbioma Humano também apontou estudos que se dedicaram a examinar diferentes interações dos microbiomas de pele, oral e urogenital, desvelando um conhecimento que prepara as bases para o desenvolvimento de produtos bioterapêuticos vivos derivados de microbiota para reduzir inflamação, restaurar a função da barreira intestinal ou, em alguns casos, melhorar a resistência à colonização contra patógenos. Tratamentos específicos usando antibióticos de origem microbiológica para tratar patógenos resistentes a antibióticos também prometem integrar a próxima onda, assim como prebióticos produzidos a partir de substratos de crescimento microbiano que podem estimular o desenvolvimento de biomarcadores.

Agora, é esperar e conferir os avanços.


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