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AtualizadoQui, 18 Abr 2024 6pm

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Daichii Sankyo

 

Atualização em patologia oncológica

sbp.jpgCristovam Scapulatempo Neto, Diretor Científico da Sociedade Brasileira de Patologia, Coordenador da Patologia do grupo COI e Orientador da Pós-Graduação do Hospital de Câncer de Barretos, comenta as publicações de 2016 que tiveram impacto no dia a dia da patologia e, consequentemente, na tomada de decisões de oncologistas e cirurgiões.

O ano foi marcado por atualizações da OMS na classificação de tumores do sistema urinário e órgãos genitais masculinos, tumores do sistema nervoso central e neoplasias hematológicas.

Os adenocarcinomas acinares de próstata classicamente são graduados utilizando o escore de Gleason atualizado em 2014 (variação de 2 a 10), mas a OMS tem incentivado a incluir nos laudos também a gradação proposta pela Sociedade Internacional de Uropatologia (grau da ISUP), que varia de 1 a 5. Para que possamos entender melhor, os tumores com escore de Gleason 3+3 são denominados grau 1, escore 7 (3+4) são grau 2, escore 7 (4+3) grau 3, escore 8 (4+4, 5+3 ou 3+5) são grau 4 e os tumores com escore 9 ou 10 (4+5, 5+4 ou 5+5) são classificados como grau 5.

Pode parecer vaidade propor uma gradação que nada mais é do que reflexo do escore de Gleason, mas o grau da ISUP tem duas vantagens: melhora a comunicação com o paciente e prediz de forma mais acurada o prognóstico da doença.  Diante de um laudo de adenocarcinoma Gleason 6, o paciente automaticamente coloca em mente que numa escala de 2 a 10 seu tumor tem uma gradação bastante elevada, quando na verdade possui um tumor indolente, o que ajuda a dimensionar as vantagens da gradação da ISUP.

Com relação aos tumores do Sistema Nervoso Central, a nova classificação incorporou as alterações moleculares na nomenclatura de uma gama de tumores, criando assim um diagnóstico integrado capaz de abranger o tipo histológico e as mutações associadas. Destaque é a necessidade de uma abordagem imunoistoquímica e/ou por PCR ou sequenciamento para a classificação dos gliomas difusos, onde é fundamental avaliar a presença de mutações de IDH1, ATRX e a presença de co-deleções envolvendo o braço curto do cromossomo 1 (1p) x e o braço longo do cromossomo 19 (19q). Em cerca de 90% dos casos, a mutação do IDH1 é a R132H, que pode ser detectada por imunoistoquímica; os 10% restantes têm que ser detectados por PCR ou sequenciamento. Mutações de IDH1 são presentes nos astrocitomas, oligodendrogliomas e glioblastomas secundários e conferem um melhor prognóstico.

Importante ressaltar que um glioma difuso sem mutação em IDH1 vai ter um comportamento biológico agressivo, semelhante ao de um glioblastoma. Alteração encontrada nos astrocitomas e frequentemente não encontrada nos oligodendrogliomas é o silenciamento de ATRX, que também pode ser definido por imunoistoquímica e pela ausência de co-deleção de 1p e 19q. Assim, independentemente do status de IDH1 e ATRX, só poderão ser chamados de oligodendrogliomas os tumores com co-deleção de 1p e 19q.

O termo PNET (tumor neuroectodérmico primitivo) foi abolido da nomenclatura, sendo utilizado apenas em caso de exceção. Pela classificação atual passam a ser chamados de tumores embrionários. Pela primeira vez um tumor é classificado de acordo com a expressão de microRNAS, como ocorreu com o tumor embrionário com rosetas estratificadas com alteração em C19MC, um complexo de microRNAs presente na região 19q13.2 que está amplificada em todos esses tumores.

Gliomatosis Cerebri deixa de ser uma entidade e passa a ser somente um padrão de crescimento (acometimento de mais de 3 lobos).

A nova entidade gliomas difuso da linha média foi introduzida para designar tumores da linha média (tálamo, ponte e medula) com histologia variada (graus II-IV), que possuem mutações na histona H3, podendo ser H3.1 ou H3.3. Essa triagem pode ser feita com estudo imunoistoquímico através do anticorpo H3 K27M. Para estratificação do prognóstico é necessário o sequenciamento, pois a H3.1 determina melhor prognóstico pela maior sensibilidade à radioterapia.

Grandes avanços foram feitos na classificação dos meduloblastomas, que além da histologia passam a considerar a expressão gênica e a idade dos pacientes, sendo assim classificados como WNT, SHH (com ou sem mutação de TP53) e não WNT/SHH (grupos 3 e 4). A adequada classificação molecular deve ser realizada com painéis de expressão gênica.

Quanto à nova classificação das neoplasias hematológicas, muitas novidades foram trazidas. Com relação às neoplasias mielóides, mais especificamente as neoplasias mieloproliferativas crônicas, a maior mudança foi a divisão dos quadros de Mielofibrose (MF), o que resultou na seguinte classificação: Leucemia Mielóide Crônica (LMC), Policitemia Vera (PV), Trombocitemia Essencial (TE), MF fase precoce/pré-fibrótica, MF fase fibrótica, Leucemia Neutrofílica Crônica, Leucemia Eosinofílica Crônica e os casos inclassificáveis. Nesse contexto, além da mutação no gene Janus Kinase2 (JAK2) que já era alteração que permitia fechar o diagnóstico de clonalidade em neoplasias mieloproliferativas crônicas não BCR-ABL, mutações envolvendo os genes calreticulina (CALR) e myeloproliferative leucemia vírus oncogene (MPL) foram incorporadas aos critérios de clonalidade no diagnóstico dessas neoplasias. É importante lembrar que, mesmo com as alterações moleculares, os achados da biópsia de medula óssea são fundamentais para a adequada classificação, como é o caso da diferenciação entre MF fase pré-fibrótica e TE.  

Nas neoplasias linfóides de células B maduras, a Linfocitose Monoclonal de Células B (MBCL) passa a ser classificada como de baixa contagem (<0,5 x 109/L), que raramente desenvolverá doença clínica, e de alta contagem, que deve ser seguida de perto para diagnóstico precoce de leucemia ou linfoma. Não existe mais o diagnóstico de LLC com contagem de linfócitos periféricos <5x109/L quando não há doença extramedular. A MBCL é uma entidade presente em quase todos os pacientes com Leucemia Linfocítica Crônica(LLC)/ Linfoma de pequenas células antes do aparecimento da doença, embora  nem todos desenvolvam LLC.

O linfoma folicular in situ passa a ser chamado de Neoplasia folicular in situ. Nesses casos, altos níveis de linfócitos circulantes (10-4 das células totais) com t (14;18) indicam um alto risco de desenvolvimento de Linfoma Folicular (FL). O LF pediátrico passa a ser uma nova entidade na nova classificação, lembrando que esse subtipo também pode ocorrer em adultos e o tratamento é somente com excisão cirúrgica. O linfoma de grandes células B (LBCL) com rearranjo em IRF4 é uma nova entidade provisória. Esse linfoma acomete o anel de Waldeyer ou linfonodos cervicais de crianças e adultos jovens, com estádio baixo, e se caracteriza por crescimento de padrão folicular, folicular e difuso ou difuso, lembrando um Linfoma difuso de grandes células B (DLBCL) ou FL grau 3. Esses tumores são positivos para IRF4/MUM1, BCL-6, cerca de 50% são positivos para CD10 e BCL-2 e uma minoria dos casos são CD5+. Ao FISH esses tumores têm rearranjos de IG/IRF4, BCL-6, mas não têm rearranjos de BCL-2. Esse linfoma é mais agressivo que o FL pediátrico, mas quando adequadamente tratado tem bom prognóstico.

Já os linfomas de células do manto (MCL) podem se desenvolver por 2 vias:

1- Ausência de hipermutação de IgVh e SOX 11+: tumores nodais e extranodais que podem adquirir alterações adicionais e se transformar em formas mais agressivas (variantes blastóide e pleomórfica).

2- Hipermutação de IgVh, SOX11-: acomete predominantemente o sangue periférico, a medula óssea e o baço (forma não nodal), caracterizando-se por doença indolente.

Os estudos de sequenciamento de última geração mostraram que todas as leucemias de células cabeludas têm mutação V600E no gene BRAF, o que não ocorre nas variantes e em todas as outras neoplasias de células B pequenas e maduras. Mutações nos genes TP53, NOTCH1, SF3B1 e BIRC3 foram descritas como fatores importantes de pior prognóstico na LLC/SLL. Nos FL, mutações envolvendo genes reguladores da cromatina como CREBBP e MLL2 são comuns e mutações acometendo o gene EZH2 ocorrem em 20-25% dos casos, todas eventos precoces e com potencial terapêutico.

Em relação aos DLBCL, a imunoistoquímica pode ser empregada para classificar a célula de origem, Célula B ativada (ABC) ou Centro Germinativo (GC), mesmo que de forma não muito acurada, através do algoritmo de Hans utilizando os anticorpos CD10, BCL-6 e MUM1. No entanto, cerca de 10-15% dos casos inclassificáveis por expressão gênica são erroneamente classificados pela imunoistoquímica. Assim, preferencialmente a classificação deve ser feita por testes de expressão gênica, haja vista que o fenótipo ABC tem pior prognóstico. Ainda dentro dos DLBCL, os Linfomas de alto grau com ou sem rearranjos de MYC, BCL-2 e BCL-6 foram especialmente discutidos. Quando por imunoistoquímica só há positividade para MYC e BCL-2 esses tumores são chamados de duplo expressores e quando são detectados rearranjos por FISH envolvendo os genes MYC, BCL-2 ou BCL-6 esses linfomas que eram chamados de “double hit” agora são chamados de Linfomas de células B de alto grau com translocações em MYC e BCL-2 ou BCL-6. A co-expressão de MYC e BCL-2, que ocorre em cerca de 20-35% dos DLBCL, já conferem maior agressividade, entretanto a presença de rearranjos envolvendo MYC e BCL-2 ou BCL-6, que ocorre em cerca de 5-15% dos DLBCL, confere agressividade ainda maior e esses linfomas.

Quando falamos de Linfomas de células T maduras, as novidades começam com a descoberta de mutações recorrentes que acometem os Linfomas angioimunoblásticos (AIL) e alguns Linfomas de células T periféricas (PTCL) que culminam com um fenótipo de célula T auxiliares foliculares, que são definidos pela expressão de pelo menos 2 ou 3 dos seguintes marcadores: CD279/PD-1, CD10, BCL-6, CXCL13, ICOS, SAP E CCR5.

Esses linfomas com fenótipo de células T auxiliares passam a ser denominados de Linfomas de células T  nodal com imunofenótipo de células T auxiliares foliculares.Essas neoplasias exibem mutações recorrentes nos genes TET2, IDH2, DNMT3A, RHOA, CD28 e fusões como ITK-SYK ou CTLA4-CD28.

O Linfoma anaplásico de grandes células (ALCL) ALK- deixou de ser uma entidade provisória para ser uma definitiva.

Novas entidades provisórias são a Doença linfoproliferativa de células T indolente do trato gastrointestinal e o Linfoma de células T cutâneo acral CD8+.

Os linfomas de células T (TCL) intestinais foram subdivididos em 2 tipos, o Tipo I designado como TCL associado a enteropatia que é associado a doença celíaca  sendo mais comum no norte da Europa, e o Tipo II que foi designado como TCL monomórfico epiteliotrópico intestinal (MEITL) que não tem associação com doença celíaca e que tem maior incidência em asiáticos e hispânicos.

Embora não tenha havido mudanças na classificação dos Linfomas de Hodgkin, a nova classificação recomenda que nos Linfomas de Hodgkin Predomínio Linfocítico Nodular (NLPHL) o padrão de crescimento baseado na expressão do CD20 seja reportado, pois está associado com o prognóstico. Na classificação de 2008  se recomendava chamar os NLPHL que progridem para um padrão difuso rico em células T, denominar NLPHL linfoma de grandes células B rico em células T e histiócitos  (THRBLCL) símile, agora recomenda-se que se denomine essas lesões de transformação do NLPHL em THRBLCL símile.

O quarto e último artigo de extrema importância para a patologia é sobre a reclassificação dos Carcinomas Papilíferos Variante Folicular Encapsulada não invasivos da tireóide, que devido ao seu comportamento indolente passou a ser denominado de Neoplasia tireoideana folicular não invasiva com núcleos papilares-símile (NIFTP).

Quando não há invasão da capsula ou invasão vascular, a simples lobectomia é o tratamento definitivo. Os patologistas precisam ser cautelosos ao fechar o diagnóstico de carcinoma papilífero na punção aspirativa, principalmente quando predominar o padrão folicular de crescimento sem observação de papilas, tendo sempre em mente a importância de informar que a lesão pode corresponder a uma NIFTP.

Esse tema já foi discutido no OncoNews no dia 24 de Abril de 2016.Os temas expostos também foram destaque em 2016 no Jornal da Sociedade Brasileira de Patologia (http://www.sbp.org.br/Publicacoes/patologista.aspx).

Referências:

 

1- The 2016 WHO Classification of Tumours of the Urinary System and Male Genital Organs-Part B: Prostate and Bladder Tumours.Humphrey PA, Moch H, Cubilla AL, Ulbright TM, Reuter VE. Eur Urol. 2016 Jul;70(1):106-19.

2- WHO Classification of Tumours of the Central Nervous System. 4thed - Louis DN, Ohgaki H, Wiestler O, Cavenee W, Ellison DW, Figarella-Branger D, Perry A, Reifenberger G, von Deimling A. Lyon - WHO, 2016.

3- The 2016 revision to the World Health Organization classification of myeloid neoplasms and acute leukemia.Arber DA, Orazi A, Hasserjian R, Thiele J, Borowitz MJ, Le Beau MM, Bloomfield CD, Cazzola M, Vardiman JW.Blood. 2016 May 19;127(20):2391-405.

4- The 2016 revision of the World Health Organization classification of lymphoid neoplasms. Swerdlow SH, Campo E, Pileri SA, Harris NL, Stein H, Siebert R, Advani R, Ghielmini M, Salles GA, Zelenetz AD, Jaffe ES.Blood. 2016 May 19;127(20):2375-90.

5- Nomenclature Revision for Encapsulated Follicular Variant of Papillary Thyroid Carcinoma: A Paradigm Shift to Reduce Overtreatment of Indolent Tumors. - Nikiforov YE, - JAMA Oncol. 2016 Aug 1;2(8):1023-9. doi: 10.1001/jamaoncol.2016.0386.


 


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