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AtualizadoQui, 18 Abr 2024 6pm

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Cuidados paliativos em foco

logo ancp horizontal peqDouglas Crispim, médico geriatra e secretário geral da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), e André Filipe Junqueira dos Santos, vice-presidente da ANCP, comentam os estudos em cuidados paliativos que foram destaque em 2017.

Cost-Effectiveness of Palliative Care: A Review of the Literature

Por Douglas Crispim

O Canadá celebra em 2017 a inversão da pirâmide, sendo que a última estatística mostrou que existem 20% de pessoas acima de 60 anos, e apenas 15% de crianças. Um alerta que havia sido dado há muitos anos, fazendo com que o sistema canadense se preparasse para esta nova etapa.

Dados do Medicare norte americano mostram que 40% do orçamento total é gasto com sêniors e 10% gasto nas últimas 4 semanas de vida.

Infelizmente a medicina responde ao sofrimento com aumento de tecnologia pesada e carga de tratamento modificador de doenças. Isto não gera resultados positivos nos pacientes com critérios de terminalidade da vida. Os cuidados Paliativos buscam aproximar os desejos dos pacientes do tratamento a ser oferecido. E esta aproximação tem tudo a ver com economizar os finitos recursos dos sistemas de saúde, público ou privado.

Quando comparado ao cuidado modificador de doença (cuidado agudo), a implementação dos cuidados paliativos multimodalidades nos hospitais teve redução objetiva de 7 a 8 mil dólares por paciente.

Esta redução tem origem principalmente em redução da média de permanência global; utilização de unidades de transição de cuidado: Hospice; redução das admissões em UTI; redução de tecnologia diagnóstica desnecessária; e redução de tratamentos específicos desnecessários, como por exemplo quimioterapias

Um artigo chamado “Cost-Effectiveness of Palliative Care: A Review of the Literature” demonstrou através de metanálise que uma redução de 24% nos gastos hospitalares foi obtida para todos os pacientes oncológicos que receberam atendimento especializado a partir do segundo dia de internação.

Uma redução ainda maior foi obtida quando houve implementação programada e planejada em 7 hospitais de grande porte, chegando a 40% de redução de custos. Houve redução de 61,5% das readmissões de pacientes aos 30 dias da alta.

Se dentro do hospital a economia é assustadora, imagine poder possibilitar atendimento paliativo em casa nos chamados Home Hospices. O Canadá economizou, segundo o artigo, 385 milhões de dólares com este tipo de serviço, sendo que segundo o mesmo artigo, o envio de apenas 10% dos pacientes dos hospitais para casa em fase final de vida gera economia de 9 milhões de dólares ao ano.

Estes dados corroboram experiências exitosas que já existem no Brasil. Serviços implementados com planejamento e gestão tem resultados facilmente comprovados.

Convido o leitor a pensar por um minuto: já reparou que na atual situação de ruptura do sistema atual de financiamento em saúde pública e privada, seria muito bom que alguma modalidade gerasse um “ganha, ganha, ganha” no trio paciente, prestador e financiador (SUS ou operadoras). Pois bem, esta modalidade existe! Seu serviço vai acompanhar a mudança inevitável ou vai esperar o enraizamento da crise?

O Canadá já iniciou uma grande campanha nacional para universalizar este tipo de cuidado. Esperamos que o Brasil saiba seguir bons exemplos.

Palliative care linked to fewer repeat hospitalizations

Por Douglas Crispim

Este artigo avaliou a redução das internações repetidas em pacientes oncológicos em fase avançada de doença. Sabe-se que este grupo de pacientes muitas vezes fica com assistência prejudicada no fim da vida, pois os serviços de oncologia tendem a oferecer alta tecnologia para tratamento modificador de doença e uma importância menor aos cuidados paliativos, principal demanda de tratamento para esta fase da doença.

O autor ressalta que os cuidados paliativos aumentam a qualidade de vida e conforto de pacientes e familiares em todas as fases da doença, mas mesmo assim grande parte dos pacientes nos EUA nunca irão receber este cuidado.

O estudo mostrou uma redução das internações de 35% para 18% após uma simples avaliação e acompanhamento por grupo especializado. Este estudo também ressaltou que muitos pacientes que foram admitidos nas sextas-feiras não receberam o cuidado pois a equipe funcionava apenas aso dias de semana, sugerindo que este cuidado deveria ser rotina para todos os grandes e médios hospitais.

No Brasil, podemos fazer um paralelo importante. Repare que até 5% de todos os atendimentos em unidades de emergência são de pacientes com critérios claros de terminalidade, sendo que boa parte destes irá internar. Chegamos a ter especialistas em neurologia nestas unidades, garantindo protocolos específicos de cefaleia e doenças cerebrovasculares. Isto reduz mortalidade e aumenta a eficácia do atendimento, assim teremos menos pessoas inválidas de menos óbitos. O mesmo ocorre com cardiologia.

Repare que os pacientes com critérios de terminalidade quando não reconhecidos e tratados adequadamente de maneira precoce, irão ser encaminhados para a medicina modificadora de doença tradicional, fornecida pelos profissionais de medicina interna e terapia intensiva. Porém o maior detalhe é que estes pacientes não irão ter benefícios claros destas abordagens, irão sofrer mais longe de suas famílias e com os procedimentos invasivos, e ao final não irão sobreviver. Portanto não tenho dúvidas em afirmar que os paliativistas médicos e não médicos deveriam ser parte integrante de todas as instituições sérias que praticam cuidados de saúde. Em especial unidades de oncologia, neurologia e geriatria.

Muitos gestores estão acordando para esta realidade. Medicina centrada na pessoa em doenças avançadas é sinônimo de Cuidados Paliativos, urgente.

A Lesser Known Advanced Directive: ‘Do-Not-Hospitalize’

Douglas Crispim

Próximo ao fim da vida, o número de hospitalizações é crescente. Enquanto algumas internações são realmente necessárias, boa parte delas é evitável e desnecessária. Porém o sistema está preparado para responder a intercorrências previsíveis como se fossem emergências reais e imprevisíveis, aumentando a chance de intervenções desnecessárias e internações prolongadas. Este cenário se torna ainda pior com pacientes frágeis e com autonomia comprometida.

Enquanto que no Brasil estamos aprendendo o significado de uma DNR (Do Not Ressucitate) ou ONR (Ordem de Não Ressuitação), alguns hospices e redes de cuidado nos EUA já discutem o DNH (Do Not Hospitalize) ou ONH (Ordem de Não Hospitalização).

Nesta pesquisa, foi averiguado que em Nova York, 6% dos residentes de ILPIs (instituições de longa permanência para idosos) possuem uma DNH, incluindo doenças crônicas como Doença de Alzheimer.

Os profissionais que utilizam a ferramenta advertem para a necessidade de que se realizem conversas direcionadas, e que se siga uma orientação semelhante a do “Living Will”, que aqui no Brasil seria as DAVs (Diretivas Antecipadas de Vontade). O caminho é o mesmo porém, segundo eles, muitas vezes a linguagem é vaga e a informação direta sobre a hospitalização fica diluída entre tantas outras. Porém deveria estar mais visível e em destaque pois a decisão sobre hospitalizar ou não muitas vezes deve ser tomada rapidamente.

Fica a dica para as ILPIs e serviços de Home Care no Brasil: Primeiramente contratarem para seu staff uma equipe de Cuidados Paliativos, aumentando a eficácia dos planos terapêuticos e satisfação do usuário, e inserir a prática da DNH, criando protocolos de últimos dias de vida e intercorrências para seus pacientes. Não basta não internar, tem que cuidar com excelência no local de origem!

Alleviating the access abyss in palliative care and pain relief— an imperative of universal health coverage: the Lancet Commission report

Por André Filipe Junqueira dos Santos

Esse relatório, elaborado por especialistas em saúde global e cuidados paliativos, reforça a visão de que habitantes de países pobres ao redor do mundo vivem e morrem com pouco ou nenhum alívio da dor ou sem cuidados paliativos, sendo que o artigo denomina isso de "uma falha médica, de saúde pública e moral e uma fraude da justiça". Ele culpa o fato de que o progresso da saúde das pessoas é medido em anos extras de vida ou produtividade, com peso insuficiente dado à dignidade. Além disso, o foco do estabelecimento médico em curar doenças levou a um foco de minimização na assistência e na qualidade de vida das pessoas perto da morte.

Com consumo anual de 298,5 toneladas métricas de morfina e medicamentos similares distribuídos em todo o mundo a cada ano, apenas 0,1 tonelada métrica é destinada a países de baixa renda. No entanto, um pacote básico de cuidados paliativos, que inclui medicamentos-chave e cuidados pessoais, não é caro, custando cerca de US$ 2,40 per capita por ano em países de baixa renda e US $ 0,75 em países de renda média baixa.

O relatório exige novos métodos para medir o progresso da saúde que incluem o sofrimento e para a inclusão de cuidados paliativos como das políticas nacionais de saúde.