2021

Biópsia líquida e sequenciamento do exoma total mostram valor preditivo e prognóstico no câncer colorretal metastático

allan pereira bxElena Élez, médica do Instituto de Oncologia Vall D’Hebron, em Barcelona, é primeira autora de estudo selecionado como Late Breaking Abstract no 23º Congresso ESMO dedicado aos tumores do trato gastrointestinal. “Embora seja um estudo que traga novos insights para avaliação molecular quanto a sensibilidade de terapia-alvo inibidora de BRAF em pacientes com câncer colorretal metastático, esses resultados vieram de um número muito pequeno de pacientes, o que nos obriga a esperar sua validação em coortes maiores”, avalia o oncologista Allan Pereira (foto).

“Nosso grupo relatou anteriormente que os pacientes com câncer colorretal metastático (mCRC) com mutação BRAFV600E tratados com inibidores BRAF / EGFR +/-MEK podem ser divididos em três subgrupos prognósticos diferentes, de acordo com a carga tumoral. Aqui, integramos a análise de fração alélica (MAF) de BRAFV600E em DNA livre de células (cfDNA), ao sequenciamento de exoma inteiro (WES) para revelar dados preditivos e perfis prognósticos”, destacam os autores.

Este estudo de coorte internacional, prospectivo e multicêntrico incluiu 59 pacientes com mCRC BRAFV600E do Vall d’Hebron, em Barcelona, e da Università della Campania L. Vanvitelli, em Nápoles, que receberam encorafenibe-cetuximabe com ou sem binimetinibe. Amostras do plasma basal foram extraídas de 40 pacientes e o teste de BRAF MAF por PCR digital em gotas (ddPCR) foi realizado na linha de base. Além disso, as amostras de plasma para o sequenciamento do exoma inteiro (WES) foram extraídas de 23 pacientes na linha de base. Todos os pacientes receberam inibidores BRAF / EGFR + ou -MEK. As respostas foram avaliadas a cada 8 semanas. O endpoint primário foi correlacionar BRAF MAF com a sobrevida global e taxa de resposta global. Os endpoints secundários incluíram a identificação de uma assinatura genômica por sequenciamento de exoma inteiro (WES), com potencial de prever desfechos clínicos.

Resultados

A idade média foi de 61 anos (33-83), 56% mulheres, 34% com tumores do lado direito. Dessa população, 56% receberam 2 ou mais linhas de quimioterapia.

Os resultados apresentados na ESMO-GI por Élez e colegas mostram que a mediana de SLP foi de 5,2 meses (IC 95% 4,1-8,5) e a mediana de SG de 10,3 meses (IC 95% 6,5-20,2). A proporção de BRAF MAF foi> 5% em 14 pacientes (35%), <5% em 10 pacientes (25%) e indetectável em 16 pacientes (40%), com mediana de SG de 4,2 meses, 17,1 meses (HR 0,21, p <0,001) e 17,5 m (HR 0,15, p <0,001), respectivamente.

Na análise multivariada, fatores como ECOG, presença de metástase hepática, níveis de CEA, NLR e BRAF MAF foram considerados. “Nós estratificamos os pacientes em três grupos prognósticos com base no número de fatores de risco apresentados. Estes três grupos prognósticos mostraram resultados de SG diferenciados, com mediana de SG de 5,1 m, 8,4 m (HR 0,26, p <0,001) e 21,8 m (HR 0,05, p <0,005), respectivamente”, apontam os pesquisadores.

A análise do sequenciamento do exoma total mostrou benefício clínico da terapia-alvo naqueles tumores com ganho de BRAF / EGFR, bem como enriquecimento da resposta em tumores com mutação RNF43. “Nossos dados preliminares sugerem que cfDNA BRAF MAF pode ser um surrogate capaz de expressar de forma significativa a carga do tumor e sua correlação com sobrevida global. A biópsia líquida (cfDNA BRAF MAF) e o sequenciamento do exoma total (WES) podem ajudar a identificar três subgrupos de pacientes com diferentes características prognósticas e preditivas com potencial implicações terapêuticas”, destacam os autores.

O oncologista Allan Pereira, médico do Hospital Sírio-Libanês e chefe da residência médica em oncologia clínica do Hospital de Base do Distrito Federal, observa que a combinação de inibidor de BRAF + anticorpo anti- EGFR (+/- inibidore do MEK) foi um avanço substancial para o tratamento de pacientes com câncer colorretal metastático detentores de mutação BRAF V600E2. “No entanto, nem todos os pacientes respondem e algumas das respostas não são duradoras. O presente estudo teve 2 objetivos: (1) avaliar o papel prognóstico da avaliação de mutação BRAF por ctDNA nesta população e (2) realizar uma análise abrangente de multi-sequenciamento (incluindo whole genome sequencing [WES]) para pesquisar potenciais biomarcadores preditivos de resposta”, esclarece.

Quanto ao objetivo 1, a análise de BRAF V600E por ctDNA foi usada como um surrogate de carga tumoral. “O ponto de corte de 5% para fração alélica mutante (MAV) a fim de determinar o que seria uma alta ou baixa carga tumoral veio de estudos prévios dos autores. Foi mostrado aqui que MAF > 5% se comportou como fator de pior prognóstico independente em análise multivariada para sobrevida global”, afirma Pereira.

Segundo o especialista, é sabido que mutações BRAFV600E exibem um comportamento subclonal 3 e o padrão de disseminação desta doença pode limitar a interpretação das análises de ctDNA. “Talvez a comparação de níveis de MAFs do mesmo paciente em diferentes timepoints ao longo do tratamento seja mais promissora em trazer informações prognósticas ou mesmo de resposta terapêutica de forma mais precoce do que atuais avaliações por imagem após 2-3 meses”, avalia.

Quanto ao objetivo 2, o especialista afirma que é interessante observar que a polissomia do cromossomo 7 (onde estão os genes EGFR, MET e BRAF) foi significativamente associada ao benefício clínico da terapia-alvo e que respondedores tinham mais mutação em RNF43 no que não respondedores.

“Embora seja um estudo que traga novos insights para avaliação molecular quanto a sensibilidade de terapia-alvo inibidora de BRAF nesta população, esses resultados vieram de um número muito pequeno de pacientes, o que nos obriga a esperar sua validação em coortes maiores”, conclui Pereira.

Referências:

1 - LBA 3 - Integrated analysis of cell-free DNA (cfDNA) BRAF mutant allele fraction (MAF) and whole exome sequencing in BRAFV600E metastatic colorectal cancer (mCRC) treated with BRAF-antiEGFR +/- MEK inhibitors

2 - N Engl J Med 2019; 381:1632-1643 DOI: 10.1056/NEJMoa1908075

3 - Dienstmann R et al. Mol Oncol. 2017 Sep;11(9):1263-1272