ASCO 2018

Abi-race: diferenças raciais e resposta à hormonioterapia

GUSTAVO GUIMARAES NET OKAnálise prospectiva que comparou resultados de pacientes negros e brancos com câncer de próstata metastático resistente à castração tratados com abiraterona e prednisona é tema de pôster discussion na ASCO 2018, com os resultados do estudo Abi-Race (LBA 5009). Quem comenta os resultados do estudo é o urologista Gustavo Guimarães (foto), Diretor do Departamento de Cirurgia Oncológica da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo.

Dados retrospectivos sugerem que pacientes negros podem ter taxas de resposta de PSA mais altas do que pacientes caucasianos com mCRPC tratados com abiraterona. No estudo Abi-Race, os pesquisadores avaliaram prospectivamente os resultados de abiraterona em caucasianos e afro-americanos com mCRPC.

Métodos

O estudo considerou 100 homens (50 negros, 50 brancos) com mCRPC, agrupados por raça, por autoidentificação. Todos os pacientes receberam 1000 mg/d de acetato de abiraterona (AA) e 10 mg/d de predinisona (P), até progressão da doença ou eventos adversos inaceitáveis (AE).

O endpoint primário foi sobrevida livre de progressão radiográfica (rPFS); os endpoints secundários foram a cinética do PSA e segurança. Análises exploratórias incluíram Polimorfismo de Nucleotídeo Único (SNP), metabolômica e diferenças hormonais por raça.

Resultados

A mediana de rPFS para pacientes afro-americanos e brancos foi de 16,8 meses nos dois grupos avaliados. No entanto, a SLP PSA variou por raça, com mediana de 16,6 e 11,5 meses para negros e brancos, respectivamente (veja quadro abaixo). Pacientes afro-americanos também tiveram taxas numericamente mais altas de declínio de PSA ≥30%, ≥50% e ≥90%.

Em relação ao perfil de segurança, EAs foram semelhantes em frequência e gravidade por raça, incluindo hipertensão (42% vs 40%). No entanto, a fadiga foi maior em caucasianos (40% vs 26%), e a hipocalemia foi maior em afro-americanos (36% vs 18%).

O perfil de SNP revelou diferenças nos principais genes envolvidos no metabolismo e transporte de andrógenos.

O estudo mostra que pacientes afro-americanos tiveram resposta maior e mais duradoura com terapia hormonal baseada em abiraterona. Os autores observam que novos estudos prospectivos são necessários para entender diferenças raciais nos resultados de novos regimes hormonais.

Para Robert Dreicer, membro da ASCO que comentou os resultados do Abi Race, este estudo mostra que a pesquisa prospectiva de desfechos clínicos por subgrupos raciais e étnicos é viável e lança as bases para futuros estudos, a exemplo do Erleadea, que avalia resultados com apalutamida. Os pesquisadores também estão envolvidos no chamado IRONMAN, um registro global que reúne cerca de 5 mil pacientes com câncer de próstata avançado.

“As minorias raciais e étnicas continuam sub-representadas nos estudos clínicos. Este estudo deve servir como uma chamada para toda a comunidade de pesquisa em câncer para tornar os estudos muito mais inclusivos. Quando falamos sobre tratamentos contra o câncer, as pessoas não são todas iguais e é importante entender como diferentes grupos respondem a diferentes terapias”, concluiu Dreicer.

                                                                                                                  Resultados da Resposta de PSA

Resposta PSA
Negros afro-americanos
Brancos
> 30% PSA Decline 86 76
> 50% PSA Decline 76 66
> 90% PSA Decline 48 38
No PSA Decline 4 8
Mediana PSA PFS (mo) 16,6 (95% IC 11,5 - ) 11,5 (95% IC 8,5, 19,3)

 

Abi-race: análise dos resultados

Por Gustavo Guimarães, Diretor do Departamento de Cirurgia Oncológica da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo.

acientes da raça negra têm tumores de próstata em idades mais precoce e geralmente mais agressivos, tanto que a recomendação das sociedades médicas é que o rastreamento comece em idade mais precoce neste grupo de pacientes.

No entanto, o real impacto no resultado dos tratamentos ainda desperta controvérsias, pois em muitos casos a dificuldade de acesso a meios diagnósticos e de tratamento influenciam o resultado.

O estudo Abi-Race, apresentado na ASCO 2018, é muito interessante em vários aspectos, com destaque para a possibilidade de representar nos estudos os diversos grupos étnicos e raciais e, desta forma, verificar a influência das variabilidades genéticas na resposta à abiraterona em 100 pacientes (sendo 50 caucasianos e 50 pacientes afro-americanos) no cenário do cancer de próstata metastático resistente à castração.

O estudo demonstrou claramente que afro-americanos têm graus de toxicidade diferentes dos caucasianos em relação à abiraterona, sendo a hipocalemia, hiperglicemia e hipertensão mais frequentes em afro-americanos, enquanto fadiga e vômitos, por exemplo, são mais frequentes em caucasianos.

Apesar de sobrevida livre de progressão radiológica não ter tido diferença estatística entre os grupos, a sobrevida livre de progressão bioquímica foi maior e mais duradoura nos pacientes afro-americanos.

Porém, ao analisar os grupos, os pacientes afro-americanos receberam menos tratamento prévio em comparação com o grupo caucasiano. No grupo de pacientes afro-americanos, apenas 24% receberam tratamento com sipuleucel-T versus 40% no grupo de pacientes caucasinos. Bicalutamida prévia foi aplicada em 66% dos afro-americanos e 72% nos caucasianos, da mesma forma que o docetaxel (22% causaianos versus 16% afro-americanos). Esse dado pode, teoricamente, ter influenciado este resultado, já que os afro-americanos receberam menos tratamento prévio.

O trabalho também avaliou o polimorfismo de nucleotídeo único em genes relacionados ao transporte de andrógenos, e houve uma clara separação entre os grupos. Se esta alteração é somente relacionada à variabilidade genética entre os grupos ou se tem influência de maior tratamento do grupo caucasiano, estudos futuros e com maior número de pacientes podem esclarecer esta questão.

Referência: 
Abstract LBA5009: Abi Race: A prospective, multicenter study of black (B) and white (W) patients (pts) with metastatic castrate resistant prostate cancer (mCRPC) treated with abiraterone acetate and prednisone (AAP).
Genitourinary (Prostate) Cancer Poster Discussion Session
Apresentação: Daniel J. George, Duke University
Sábado, 2 de junho