Terapia endócrina no câncer de mama metastático

Maftine_NET_OK.jpgUma das autoridades mundiais em câncer de mama, a oncologista Martine Piccart (foto), diretora de medicina do Jules Bordet Institute, em Bruxelas, Bélgica, discute os progressos da terapia endócrina no cenário metastático. O assunto foi tema de uma de suas apresentações no IX Congresso Franco-Brasileiro de Oncologia, que aconteceu entre os dias 10 e 12 de novembro, no Rio de Janeiro.

No cenário metastático, a terapia endócrina tem sido o padrão de tratamento da grande maioria de pacientes com status positivo para receptor de estrogênio, por sua eficácia e tolerabilidade.
 
No entanto, a resistência à terapia endócrina ocorre em parcela significativa dos pacientes e é mediada por receptores de estrogênio (ESR1) e/ou hiperativação compensatória de outras vias de sinalização, tais como mTOR / PI3K/AKT ou quinases dependentes de ciclina. A maior compreensão desse comportamento biológico levou ao desenvolvimento de uma nova geração de agentes, com resultados que mudam a prática clínica. É o caso de palbociclib, um inibidor CDK4 / 6 proposto como padrão de tratamento em primeira linha com base nos resultados impressionantes dos estudos PALOMA 1 (20,2 meses vs 10,2 meses para terapia endócrina isoladamente) e PALOMA2.
 
Os medicamentos que atuam nas vias mTOR/PI3K/AKT também foram testados em esquemas de combinação. É o caso do inibidor de mTOR everolimus. O agente foi aprovado com base nos resultados do estudo BOLERO-2, que mostrou ganho de sobrevida livre de progressão na comparação com terapia endócrina (10,6 vs 4,1 meses), ainda que a toxicidade possa ser significativamente aumentada em alguns pacientes.
 
Outro agente testado em combinação com terapia endócrina foi o inibidor de panPI3K buparlisib, avaliado no ensaio BELLE-2. O estudo comparou buparlisib e fulvestranto versus fulvestranto sozinho como segunda linha de tratamento e mostrou um pequeno benefício de SLP (6,9 vs 5 meses), favorecendo o braço da combinação.
 
Destaca-se neste estudo o uso de DNA circulante do tumor para analisar as mutações PIK3CA, sendo o benefício mais significativo para os pacientes mutantes (7 vs.3,2 meses), embora relativamente modesto. No entanto, a toxicidade foi mais uma vez uma questão relevante. Em paralelo, a pesquisa translacional demonstrou até agora não ser capaz de produzir e validar biomarcadores preditivos para qualquer um dos novos agentes, o que poderia ajudar na seleção do paciente, tanto para a pesquisa experimental, quanto para uso clínico.
 
Assim, o caminho no campo da terapia endócrina parece apontar para a maior integração entre a pesquisa clínica para o desenvolvimento de novos fármacos combinada à identificação de biomarcadores preditivos. Sem isso, os pacientes serão expostos a agentes caros e tóxicos que podem não trazer os benefícios esperados.
 
Autora: Martine Piccard é oncologista clínica e diretora de medicina do Jules Bordet Institute, em Bruxelas, Bélgica.