Terapia hormonal adjuvante em carcinoma epitelial de ovário

EVA_NET_OK.jpgEm artigo exclusivo, o oncologista clínico Diocésio Alves Pinto de Andrade, membro do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA), comenta estudo publicado no Journal of Clinical Oncology que avaliou a indicação de hormonioterapia adjuvante no câncer de ovário ressecado. Apesar do baixo número de pacientes incluídos, o resultado do estudo é de certa forma surpreendente ao demonstrar uma diminuição do risco de óbito de 37% em favor das pacientes que receberam hormonioterapia adjuvante.

EVA_NET_OK.jpgEm artigo exclusivo, o oncologista clínico Diocésio Alves Pinto de Andrade, membro do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA), comenta estudo publicado no Journal of Clinical Oncology que avaliou a indicação de hormonioterapia adjuvante no câncer de ovário ressecado. Apesar do baixo número de pacientes incluídos, o resultado do estudo é de certa forma surpreendente ao demonstrar uma diminuição do risco de óbito de 37% em favor das pacientes que receberam hormonioterapia adjuvante.

Diocésio Alves Pinto de Andrade*

O câncer de ovário representa o sétimo câncer mais comum em mulheres no mundo; em 2008 aconteceram mais de 140 mil óbitos decorrentes desta doença1. No Brasil, o câncer de ovário é o oitavo câncer mais prevalente em mulheres, com uma taxa média de 5,58 casos novos ano para cada 100 mil mulheres, sendo que em algumas regiões do país, como a Centro-Oeste, esta neoplasia ocupa a quinta colocação2.
 
O tratamento do câncer de ovário é primariamente cirúrgico. De acordo com o estadiamento da doença, esta cirurgia pode ser mais ou menos radical, indo desde uma ressecção simples de um dos ovários se a doença for de baixo grau, confinada apenas ao ovário e a mulher tiver o desejo de engravidar, até cirurgias bem complexas como a retirada dos dois ovários, das duas trompas de falópio, do útero, dos linfonodos pélvicos e retroperitoneais e da gordura que recobre o intestino (omento).
 
Após a realização da cirurgia, também de acordo com o estadiamento da doença, será decidido pela realização ou não de quimioterapia complementar, conhecida como quimioterapia adjuvante. A quimioterapia do câncer de ovário, independente se no caráter adjuvante ou paliativo, é baseado nos sais de platina. No caráter paliativo, existe ainda a possibilidade de hormonioterapia com uma das seguintes opções: acetato de megestrol, tamoxifeno, inibidor de aromatase ou fulvestranto.
 
Baseado neste racional de hormonioterapia e em alguns estudos retrospectivos de reposição hormonal em pacientes com câncer epitelial de ovário ressecado3, no fim do mês de setembro foi publicado no Journal of Clinical Oncology o estudo Adjuvant Hormone Therapy May Improve Survival in Epithelial Ovarian Cancer: Results of the AHT Randomized Trial, iniciado em 1990 e liderado pela Dra. Rosalind Eeles, que avaliou a indicação de hormonioterapia adjuvante no câncer de ovário ressecado.
 
Este estudo de fase III foi desenvolvido em três países europeus (Reino Unido, Espanha e Hungria) e recrutou durante 5 anos apenas 150 pacientes independente do seu estado menopausal. Estas pacientes foram randomizadas para dois grupos: metade para receber hormonioterapia e a outra metade para o grupo controle (não receberam placebo). Devido ao baixo recrutamento, o estudo foi interrompido, porém as pacientes foram seguidas4.
 
A grande maioria das pacientes estavam na pós-menopausa (77%) e apresentavam doença em um estaio avançado em 63% dos casos (FIGO III ou IV). A mediana de idade foi 58,7 anos. O tratamento hormonal utilizado era de acordo com a escolha médica e compreendeu 4 categorias: estrógenos conjugados, adesivo de estradiol, implante de estradiol e estrógeno conjugado associado ao norgestrel. O acompanhamento médio destas pacientes foi de 19,1 anos4.
 
O resultado demonstrado pelo estudo é de certa forma surpreendente pelo baixo número de pacientes incluídos. Uma diminuição do risco de óbito de 37% em favor das pacientes que receberam hormonioterapia adjuvante é surpreendente, apesar de apenas 75 pacientes em cada braço do estudo. Além disso, era permitido a inclusão de pacientes de todos os estadios, o que compromete uma análise de sobrevida num estudo em oncologia.
 
O fato deste estudo ter sido publicado numa revista de grande impacto como a JCO nos permite discutir a realização de novos estudos prospectivos com o mesmo racional realizado, porém com um maior número de pacientes incluídos. Este tratamento apresenta baixíssimo índice de efeitos colaterais, o que melhoraria em muito a qualidade de vida destas pacientes.

Autor: Diocésio Alves Pinto de Andrade é diretor técnico do Instituto Oncológico de Ribeirão Preto (InORP) e membro do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA) 

Referências
 
1 - Ferlay J, Shin HR, Bray F, et al: GLOBOCAN 2008 v2.0, Cancer Incidence and Mortality Worldwide: IARC CancerBase No. 10. http://www.globocan.iarc.fr.
 
2 - INSTITUTO NACIONAL DO CANCER (Brasil). Estimativa 2014: Incidência de câncer no Brasil. Coordenação de Prevenção e Vigilância. Rio de Janeiro, 2014. Disponível em: http://www.inca.gov.br/estimativa/2014. Citado em 03/11/2015.
 
3 - Eeles RA, Tan S, Wiltshaw E, et al: Hormone replacement therapy and survival after surgery for ovarian cancer. BMJ 302:259-262, 1991.
 
4 - Eeles RA, et al. Adjuvant Hormone Therapy May Improve Survival in Epithelial Ovarian Cancer: Results of the AHT Randomized Trial. J Clin Oncol 2015; Sep 28: [epub ahead of print].