IMRT hiperfracionada no carcinoma nasofaríngeo recorrente localmente avançado

gustavo nader marta bxA reirradiação com fracionamento convencional para pacientes com carcinoma nasofaríngeo recorrente localmente avançado após um curso anterior de radioterapia de alta dose é frequentemente associada a toxicidade tardia substancial. Agora, estudo randomizado de Fase 3 publicado no The Lancet demonstrou que a radioterapia de intensidade modulada (IMRT) hiperfracionada pode diminuir significativamente a taxa de complicações tardias graves e melhorar a sobrevida global nessa população de pacientes. O radio-oncologista Gustavo Nader Marta (foto) comenta os resultados.

O estudo de Fase 3, multicêntrico, randomizado, aberto, realizado em três centros em Guangzhou, China. Foram incluídos pacientes entre 18 e 65 anos de idade com diagnóstico de carcinoma nasofaríngeo avançado localmente recorrente confirmado histopatologicamente.

Os participantes foram randomizados (1:1) para receber hiperfracionamento (65 Gy em 54 frações, administrado duas vezes ao dia com um intervalo de tempo interfração de pelo menos 6h) ou fracionamento convencional (60 Gy em 27 frações, administrado uma vez ao dia). A IMRT foi utilizada em ambos os grupos. Um programa de computador gerou a sequência de atribuição e a randomização foi estratificada por centro de tratamento, estádio tumoral na recorrência (T2–T3 vs T4) e estádio nodal na recorrência (N0 vs N1–N2), determinado no momento da randomização.

Os dois endpoints primários foram a incidência de complicações tardias graves definidas como a incidência de complicações tardias radio-induzidas grau 3 ou superior 3 meses após a conclusão da radioterapia até o último seguimento clínico; e sobrevida global definida como intervalo de tempo desde a randomização até a morte por qualquer causa na população por intenção de tratar.

Resultados

Entre 10 de julho de 2015 e 23 de dezembro de 2019, 178 pacientes foram selecionados para elegibilidade, 144 dos quais foram inscritos e randomizados para hiperfracionamento ou fracionamento convencional (n = 72 em cada grupo). 35 (24%) participantes eram mulheres e 109 (76%) eram homens.

Após um acompanhamento mediano de 45 meses (IQR 37,3-53,3), houve uma incidência significativamente menor de toxicidade tardia radio-induzida grau 3 ou superior no grupo de hiperfracionamento (23 [34%] de 68 pacientes) versus o grupo de fracionamento convencional (39 [57%] de 68 pacientes; diferença entre os grupos –23% [95% CI –39 a –7]; p=0,023).

Os pacientes no grupo do hiperfracionamento tiveram melhor taxa de sobrevida global em 3 anos comparado com os pacientes no grupo de fracionamento convencional (74,6% [95% CI 64,4 a 84,8] versus 55,0% [43,4 a 66,6]; hazard ratio para morte 0,54 [95% CI 0,33 a 0,88]; p=0,014). Houve menos taxas de complicações tardias de grau 5 no grupo de hiperfracionamento (cinco [7%] hemorragia nasal) do que no grupo de fracionamento convencional (16 [24%], incluindo duas [3%] necrose nasofaríngea, 11 [16%] hemorragia nasal, e três [4%] necrose do lobo temporal).

“A IMRTcom hiperfracionada pode diminuir significativamente a taxa de complicações tardias graves e melhorar a sobrevida global entre pacientes com carcinoma nasofaríngeo recorrente localmente avançado. Nossos achados sugerem que a IMRT  hiperfracionada / pode ser usada como padrão de tratamento para esses pacientes”, afirmam os autores.”

Gustavo Nader Marta, radio-oncologista do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, observa que esse é primeiro ensaio clínico randomizado fase 3 que avaliou o papel da reirradiação no resgate de pacientes com diagnóstico de carcinoma de nasofaringe. “Os autores demonstraram que o esquema com hiperfracionamento foi superior ao esquema convencional. Vale destacar também que é de fundamental importância a seleção adequada de pacientes para realização da reirradiação, uma vez que o tratamento pode estar associado a taxas de complicações que não são desprezíveis. Por fim, para a realização de reirradiação, é essencial utilizar a técnica IMRT para minimizar os riscos de efeitos colaterais”, conclui.

O estudo está registrado no ClinicalTrials.gov, NCT02456506.

Referência: Rui You, Ming-Yuan Chen et al - Hyperfractionation compared with standard fractionation in intensity-modulated radiotherapy for patients with locally advanced recurrent nasopharyngeal carcinoma: a multicentre, randomised, open-label, phase 3 trial, The Lancet, 2023, ISSN 0140-6736,  https://doi.org/10.1016/S0140-6736(23)00269-6.